Revista da EMERJ (Edição Especial) nº 63 - page 54

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 46 - 69, out. - dez. 2013
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Logicamente a resposta também passava pela indicação de, antes
de qualquer atitude, um profissional do direito. Todavia, e para além de
uma eventual tentativa de “consulta particular”, entendi necessário rea-
dequar a questão e indagar ao jovem o que ele pretendia fazer diante
daquela situação.
Isto porque, no caso, desde o meu ponto de vista, a postura e a
forma de enfrentamento do problema mudariam a abordagem jurídica
a ser utilizada. A
primeira alternativa
seria a de procurar uma estratégia
que reduzisse os danos pessoais causados por aquele processo de crimi-
nalização. Neste sentido, uma das possibilidades seria a de comparecer à
audiência, aceitar a transação penal com o Ministério Público, negociar
algumas condições viáveis de cumprimento do acordo para evitar o pro-
cesso criminal e os seus efeitos – p. ex., comparecimento em algumas ses-
sões de grupos de autoajuda como narcóticos anônimos, proposta padrão
realizada pelo Ministério Público gaúcho no caso de imputação de porte
de drogas para consumo pessoal (sobre o tema, conferir Mayora, Garcia,
Weigert & Carvalho, 2012).
A
segunda alternativa
, porém, implicaria uma posição de enfren-
tamento do proibicionismo. Expliquei ao jovem que o processo poderia
ser utilizado como um manifesto e que, se levado às últimas consequên-
cias, seria um instrumento de “guerrilha” contra a política de guerra às
drogas. Neste caso, a inconstitucionalidade da proibição de que um jo-
vem adulto, consciente, se relacione voluntariamente com uma subs-
tância que lhe dá prazer, para além dos possíveis riscos do consumo,
poderia ser utilizada como um argumento que imprimisse tensão ao
proibicionismo. Assim, na audiência, poderia negar a transação penal,
afirmando que o Estado não possui legitimidade para ditar o que ele
pode ou não consumir. Como referi, o processo seria transformado em
um manifesto.
Não restam dúvidas de que é inexigível que todas as pessoas crimi-
nalizadas tenham esta postura. A propósito, tentar reduzir ao máximo os
danos individuais causados pela criminalização é uma atitude totalmente
legítima. Mas ingressar nesta trincheira e transformar um caso em um
manifesto (um
case
jurídico) é uma alternativa que inúmeros militantes
do movimento antiproibicionista estão adotando, mesmo cientes dos
eventuais custos derivados da criminalização.
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