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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 27 - 37, out. - dez. 2013
É esclarecedor também notar, ainda que pesem algumas questões
metodológicas, que, antes da adoção do modelo proibicionista pelas con-
venções da ONU, o crescimento do número de usuários de drogas se dava
emuma velocidade muitomenor àquela apresentada após as convenções.
A página da LEAP Brasil traz esses dados, que “mentes entorpecidas”
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in-
sistem em ocultar/ignorar. De igual sorte, a experiência de Portugal pode
ser apresentada como exemplo de que existem formas mais inteligentes
de tratar a questão das drogas.
A segunda hipótese é a de que o modelo proibicionista parte de
preconceitos, de mentiras, de distorções que acabam condicionando a
atuação não só do legislador, como também dos atores jurídicos que
tratam da questão das drogas
. E aqui, inegavelmente, há um problema
hermenêutico. Por quê? Porque o intérprete ao atuar no mundo, ao criar
a norma para o caso concreto, está condicionado por uma pré-compreen-
são autoritária e equivocada, povoada de premissas equivocadas, precon-
ceitos, que não resistem a qualquer análise crítica.
Há a crença de que a droga ilícita é um mal em si, independente-
mente do uso que se faz dela. Desconhece-se, por exemplo, a influência
do contexto para o uso abusivo das drogas, de qualquer droga.
Aposta-se, por exemplo, que a “maconha” é a porta de entrada
para as demais drogas, inclusive para o crack. Todavia, não existe qualquer
estudo sério que aposte na teoria da “porta de entrada”. Ao contrário,
existe uma pesquisa do Instituto de Medicina da Academia Nacional das
Ciências dos Estados Unidos que concluiu que os padrões na progressão
do uso de drogas desde a adolescência até a idade adulta são regulares.
Ainda segundo esse estudo, pelo fato da maconha ser a droga ilícita mais
fácil de ser encontrada, é natural (e previsível) que a maioria dos usuários
de drogas ilícitas comece por ela. Essa mesma pesquisa apontou que a
maioria dos usuários de drogas começa pelo álcool e pela nicotina antes
da maconha. E nós poderíamos apontar que provavelmente antes do ál-
cool e da nicotina muitos já tinha experimentado café e açúcar, que tam-
bém são drogas. De igual sorte, uma outra pesquisa, essa da Organização
Mundial da Saúde (OMS), apontou que a ideia da maconha ser a “porta
de entrada” para drogas mais pesadas (no caso da pesquisa, a relação era
com a heroína) é a menos provável das hipóteses. Segundo essa pesquisa,
é muito mais provável que o mercado ilegal de droga, que a ilegalidade,
9 Aqui se utiliza da figura de imagem cunhada por Maria Lucia Karam.