Revista da EMERJ (Edição Especial) nº 63 - page 30

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 27 - 37, out. - dez. 2013
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Muito pelo contrário. O
proibicionismo
atenta contra o ideal de vida digna
para todos, na medida em que amplia a violência do sistema penal, refor-
ça a crença no uso da força e da repressão para resolver os mais variados
problemas sociais, propicia a corrupção de agentes estatais e não reduz os
danos do consumo abusivo de drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas.
A segunda premissa diz, na linha do preconizado pelos Professo-
res Nilo Batista e Eugenio Raúl Zaffaroni, neste Seminário, da necessi-
dade de contextualizar qualquer análise sobre a questão criminal e, em
especial, de compreender o que representa o
proibicionismo
para um
país como o Brasil.
Aqui se está a falar sobre o que Winfried Hassemer chamou de “Di-
reito Penal das Drogas”
2
, um modelo de política criminal, textos legais e
decisões judiciais que produzem efeitos concretos e efeitos perversos em
um país periférico como o Brasil. Um
Direito Penal das Drogas
que contri-
bui decisivamente para o controle social de uma multidão de brasileiros
que não interessam à sociedade de consumo: pessoas a que Zygmunt
Bauman chamou de “consumidores falhos”.
3
Ademais, nossa análise deve
partir também da constatação de que o Brasil possui atualmente a quar-
ta maior população carcerária do planeta em termos absolutos, isso em
meio ao caos e o horror encontrados no sistema penitenciário brasileiro.
Registre-se que um grande número das pessoas que se encontra
presa no Brasil está relacionado com a questão das drogas etiquetadas de
ilícitas. Para dar um único exemplo: em uma recente pesquisa promovida
pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, apoia-
da pela
Open Society Foundations
, constatou que o significante “trafican-
te” faz com que 89% dos acusados pelo crime de tráfico de drogas perma-
neçam presos durante todo o processo, independentemente da existência
ou não de dados concretos a justificar a custódia cautelar (segundo essa
pesquisa, a grande maioria desses presos é jovem - homens na faixa etária
entre 18 e 29 anos, pardos e negros – e foi presa com pequena quantida-
de de drogas. Quanto ao registro de antecedentes criminais dos detidos
por tráfico, a pesquisa mostrou que 57% dos acusados não apresentavam
antecedentes).
4
Nota-se, portanto, que o tratamento dado às drogas ilíci-
2 HASSEMER, Winfried.
Direito penal: fundamentos, estrutura, política.
Trad. Carlos Eduardo Vasconcelos. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2008, p. 315-336.
3 BAUMAN, Zygmunt.
Vidas para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias.
Trad. Carlos Alberto
Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
4 Encontrada em 01 de abril de 2013 em:
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