Revista da EMERJ (Edição Especial) nº 63 - page 70

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 46 - 69, out. - dez. 2013
68
aí a gente começou a conversar. E granada, fuzil, isto não é novidade para
mim, assim como não é novidade para a imensa maioria dos policiais do
Rio de Janeiro. E, de todos os oitenta policiais da Delegacia de Viveiro,
apenas um, uma vez na vida, tinha necessitado empregar arma de fogo.
Isso em um país que há dez anos viveu uma onda de um movimento se-
paratista que culminou inclusive com o uso de explosivos. Isso é História.
E aí, foi nesse contexto que eu me dei conta do preço que nós po-
liciais pagamos. O Professor Nilo Batista falou muito bem da brutalização
do policial. Nós temos duas referências cinematográficas, uma norte-ame-
ricana, o filme
“Um dia de treinamento”
, muitos viram e outra, nacional,
tenho certeza de que todos viram,
“Tropa de Elite I e II”
. Eu particularmente
gosto do II, acho que o II foi mais bem realizado. Mas uma coisa que me
deixou muito intranquilo foi assistir no cinema a
“Tropa de Elite I”
, as pes-
soas aplaudindo aquilo que a lei diz que eu não posso fazer, e que se eu
fizer, como lembrou muito bem o Professor Nilo Batista, eu serei brutaliza-
do, porque a morte é social. O estigma de ex-policial é tão doído quanto o
estigma de ex-criminoso.
Então, é nesse contexto, quando a gente mensura o preço que to-
dos nós pagamos, nós, operadores do Direito; os juízes não estão alheios
ao que acontece nas ruas, só que eles analisam friamente. Mas não são
ignorantes, nem juridicamente, evidentemente, nem socialmente. Os
promotores também não, os defensores também não. Mas nós, que atu-
amos na primeira fase da persecução criminal, não juridicamente, mas
faticamente, nós pagamos um preço carnal. A gente morre, se machuca.
E um preço espiritual. Eu já morri na Polícia. Eu morri na Polícia quando
em 2004 eu perdi um policial meu numa diligência da CORE no Morro dos
Macacos. E aí você morre porque você percebe que não serviu para nada,
porque continua tudo como antes. Você morre, mata, e meia hora depois,
o
status quo
é o mesmo.
E o derradeiro motivo – sou bacharel em Direito pela UFRJ, sou pro-
fessor de Direito Penal – eu ainda acredito no Direito Penal. Acho o Direito
Penal fantástico. E é nesse diapasão que inicio minhas aulas – tem uma
ex-aluna minha aqui. Inicio as minhas aulas lembrando a preciosa lição do
Professor Nilo Batista: “O Direito Penal é o instrumento de que dispõe a
sociedade para tutelar seus bens jurídicos mais relevantes, cominando,
1...,60,61,62,63,64,65,66,67,68,69 71,72,73,74,75,76,77,78,79,80,...129
Powered by FlippingBook