Revista da EMERJ (Edição Especial) nº 63 - page 17

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 9 - 23, out. - dez. 2013
15
tos fundamentais; a proibição causadora de violência, mortes, prisões e
doenças – a proibição não se harmoniza com a ideia de direitos humanos.
São conceitos incompatíveis e incongruentes. Aliás, guerras e direitos hu-
manos não são mesmo compatíveis em nenhuma circunstância.
A “guerra às drogas” não é propriamente uma guerra contra as dro-
gas. Não se trata de uma guerra contra coisas. Como quaisquer outras
guerras, é sim uma guerra contra pessoas: os produtores, comerciantes
e consumidores das arbitrariamente selecionadas drogas tornadas ilíci-
tas. Mas, não exatamente todos eles. Os alvos preferenciais da “guerra às
drogas” são os mais vulneráveis dentre esses produtores, comerciantes e
consumidores das substâncias proibidas. Os “inimigos” nessa guerra são
os pobres, não brancos, os marginalizados, os desprovidos de poder.
O encarceramento massivo de afro-americanos nos Estados Unidos
da América nitidamente revela o alvo e a função da “guerra às drogas” na-
quele país: perpetuar a discriminação e a marginalização fundadas na cor
da pele, anteriormente exercitadas de forma mais explícita com a escra-
vidão e o sistema de segregação racial conhecido como Jim Crow. O alvo
preferencial da “guerra às drogas” brasileira também é claro: os mortos
e presos nessa guerra – os “inimigos” – são os “traficantes” das favelas e
aqueles que, pobres, não brancos, marginalizados, desprovidos de poder,
a eles se assemelham.
É preciso pôr fim a essa falida e danosa política que, além de não
funcionar em sua pretensão de salvar as pessoas de si mesmas e construir
um inviável mundo sem drogas, produz demasiada violência, demasiadas
mortes, demasiadas prisões, demasiadas doenças, demasiada corrupção.
É preciso legalizar a produção, o comércio e o consumo de todas
as drogas para assim pôr fim à violência e à corrupção provocadas pela
proibição; para assim afastar medidas repressivas violadoras de direitos
fundamentais; para assim verdadeiramente proteger a saúde.
Legalizar não significa permissividade ou liberação geral, como in-
sinuam os enganosos discursos dos partidários da fracassada e danosa
proibição. Ao contrário. Legalizar significa exatamente regular e controlar,
o que hoje não acontece, pois um mercado ilegal é necessariamente des-
regulado e descontrolado. Legalizar significa devolver ao Estado o poder
de regular, limitar, controlar e fiscalizar a produção, o comércio e o consu-
1...,7,8,9,10,11,12,13,14,15,16 18,19,20,21,22,23,24,25,26,27,...129
Powered by FlippingBook