

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 68-94, Maio/Agosto 2017
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que “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições
públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades adminis-
trativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o inte-
resse maior da criança”.
O reconhecimento das crianças e dos adolescentes - e, portanto, dos
filhos - como sujeitos de direitos gerou impactos, sem sombra de dúvidas,
na configuração da filiação, de modo que resta de vez sepultada a visão dos
filhos como propriedade do pai.
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Como reflexo da nova visão eudemonista de família, o afeto passa a
ser caracterizado como o fundamento jurídico de soluções concretas para os
mais variados conflitos de interesse que se estabelecem nessa seara,
12
passan-
do a constituir, ao lado do critério biológico, importante parâmetro para o
reconhecimento de situações jurídicas.
Neste contexto, o poder familiar é, também, ressignificado, na medida
em que passa a ser exercido em razão e em prol dos interesses dos filhos, assim
como o instituto da guarda, como um dos deveres atinentes ao poder familiar.
A palavra guarda tem origem no antigo alemão
Warren
, da qual se formou a
palavra francesa
garde
, empregada para exprimir proteção, vigilância.
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No Direito brasileiro, o instituto da guarda recebeu regulamenta-
ção, inicialmente, pelos arts. 325 a 329 do Código Civil de 1916, apresen-
tando-se como prerrogativa inerente ao então pátrio poder (hoje poder
familiar) em seu art. 384, III. Com o advento da Lei n. 6.515 (Lei do
Divórcio), em 1977, os referidos dispositivos foram revogados, e a nova
lei “cuidou, especialmente, da guarda dos filhos menores em face da
separação dos cônjuges”.
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A regra de fixação da guarda era pautada na ideia de culpa, de modo
que ficava com a guarda do filho aquele que não tivesse dado causa à sepa-
ração, ou seja, aquele considerado “inocente”. Em caso de culpa recíproca, a
preferência da guarda era da mãe.
15
11 No direito romano, “um menino permanecia sob a autoridade paterna e só se tornava inteiramente romano, ‘pai de
família’, após a morte do pai; ainda mais: este era seu juiz natural e podia condená-lo à morte por sentença privada”.
(ARIÈS, Philippe; DUBY, Georges. História da vida privada. Vol. I: Do Império Romano ao ano mil. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 2009. p. 38).
12 FARIAS, Cristiano Chaves de; Rosenvald, Nelson.
Curso de Direito Civil. V
. 6: Famílias. 5. ed. Salvador: Jus-
Podivm, 2013. p. 71.
13 PEREIRA, Tânia da Silva.
Direito da Criança e do Adolescente: uma proposta interdisciplinar
. 2. ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2008. p. 393.
14 Ibidem, p. 393.
15 Lei n. 6.515/77, Art. 10: “Na separação judicial fundada no “caput” do art. 5ª, os filhos menores ficarão com o cônjuge
que a e não houver dado causa.