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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 377 - 397, Maio/Agosto 2017

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Isto é, mesmo com a triagem laboratorial, sem uma entrevista adequa-

da, ou ainda diante da possibilidade da omissão de informações por parte

do doador – caso ele esteja em período de janela imunológica –, um resulta-

do negativo poderá trazer graves consequências, uma vez que o sangue não

será descartado, ou seja, será liberado para uso transfusional.

Os argumentos que embasam a norma de regência são fundamenta-

dos por dados clínicos, cuja conclusão aponta para o fato de que os exames

sorológicos (triagem laboratorial) realizados no sangue coletado não assegu-

ram risco zero para o sangue a ser transfundido, razão pela qual a realização

de uma triagem clínica eficiente é indispensável.

Procedendo assim, diminuído estaria o risco residual do sangue doa-

do, posto que dissociado de comportamentos ou situações de risco.

A associação destas estratégias, de excluir doadores potencialmente

infectados e testar rigorosamente todas as unidades coletadas, tem sido a

medida adotada pela maioria dos serviços de hemoterapia no mundo.

Desta forma, com eventual relaxamento das normas, fatalmente esta-

ríamos diante de um provável quadro de aumento de casos de transmissão

de doenças infecciosas, não apenas AIDS. Isto conduziria ao aumento de

processos contra os próprios serviços de hemoterapia, públicos e privados,

que teriam de arcar com o elevado custo das indenizações e com o custeio

dos medicamentos de alto custo para tratamento de alguns tipos de infec-

ções, inclusive a causada pelo HIV, nos receptores contaminados.

Advém de tal sóbria linha argumentativa outro ponto que merece

explicitação, que é a possibilidade de a confiança da população nos Servi-

ços de Hemoterapia ficar abalada, pois, ante as evidências científicas, que

confirmam a impossibilidade de garantir completamente a segurança dos

produtos sanguíneos unicamente pela realização de testes laboratoriais, uma

provável reação das pessoas poderia ser a exigência do conhecimento da

procedência do sangue que lhe seria transfundido, o que é inadmissível, haja

vista as disposições atinentes à confidencialidade do ato de doação.

Ademais, os médicos, cientes dos riscos ainda maiores da transfusão

sanguínea, caso a norma fosse relaxada, ficariam sujeitos, em tese, ao dilema

ético da decisão, no momento da prescrição da transfusão, posto que, além do

risco ao receptor do sangue, estariam eles passíveis de ser incluídos em proces-

sos que objetivassem a responsabilização no caso de eventual contaminação.

Almeja-se, portanto, evitar o risco, desnecessário, de adquirir doenças

infecciosas crônicas, pela falha na segurança das transfusões, por parte de