

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 377 - 397, Maio/Agosto 2017
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ficamente comprovado e, apesar dos eventuais inconvenientes da Resolução
ora em comento, tal procedimento é a melhor forma de minorar os riscos
de contaminação do sangue.
Isso, sem mencionar alguns vírus e bactérias que sequer dispomos na
atualidade de um método de testagem laboratorial com acuidade capaz de
afastar a importância de uma triagem clínica eficiente.
Nesse prisma, se não fossem as normas de triagem (discriminatórias
por sua própria natureza), muitos danos à população já teriam sido levados
a efeito, e aqui se computem até mesmo os doadores desonestos, que irres-
ponsavelmente contribuem para a manutenção de uma situação de hipocri-
sia social, ao responder levianamente às questões formuladas no questioná-
rio de triagem clínica.
Prudente salientar que não se alude aqui ao fenômeno sociológico
usualmente atribuído ao vocábulo “discriminatórias”, mas ao significado
da palavra enquanto substantivo, que, em qualquer dicionário, poderá ser
constatado como distinguir ou diferenciar.
Portanto, o questionário de triagem clínica servirá ao propósito para
o qual foi criado se as questões forem respondidas com honestidade. Assim,
mais do que haveria garantia a qualidade do sangue, também, de uma consi-
derável economia aos cofres do Serviço de Hemoterapia. Haja vista, em um
primeiro momento, a ausência dos gastos necessários para a efetivação de
uma coleta, que, ao final, se revelaria inútil e, ainda, em um segundo mo-
mento, com eventuais custos de uma indenização ou despesas de tratamento
de um paciente contaminado por uma transfusão.
Ou seja, apesar da Resolução, nos termos em que se encontra redigida,
aproximar a noção de comportamento sexual à própria orientação sexual, o que
gera desconforto e protestos, não há que se falar em mácula à Carta Magna,
uma vez que em conflito dois princípios fundamentais, foi, apenas, o direito à
vida – como não poderia deixar de ser – privilegiado, em detrimento ao direito à
intimidade (dignidade da pessoa), mitigando-se a aplicação deste último.
Esvaem-se, assim, os argumentos da Ação Direta de Inconstituciona-
lidade ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro, pois,
prima facie
a norma
em comento não se destina exclusivamente a homossexuais, mas a todo e
qualquer homem que faça sexo com outro homem, bem como as parceiras
destes, justamente pelo risco acrescido do comportamento sexual desenvol-
vido pelas partes, o que descaracteriza qualquer conduta persecutória por
parte dos Órgãos de controle.