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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 377 - 397, Maio/Agosto 2017

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Da mesma forma, irrefragável a ausência de inconstitucionalidade

nos textos normativos invocados, uma vez que, como visto, apenas optou-se

pela mitigação do respeito à dignidade da pessoa humana, em privilégio ao

direito à vida e à integridade física do receptor do sangue coletado, posto

que inafastável a ponderação que, em um Estado Democrático de Direito,

o exercício dos direitos individuais não poderá menoscabar o exercício de

direitos pela coletividade.

A própria evolução do Biodireito, ciência que tem nas normas em

comento exemplificação, conduz à conclusão que ora salientamos, posto

que, ao se fundar na Bioética, que por sua vez baseia-se na Ética, inafastável

caminhar-se no sentido de que o exercício dos direitos alegadamente viola-

dos, jamais poderia colocar em risco a integridade física, e porque não dizer

a própria vida, de outrem.

Cogitar o exercício de direitos – não negados, mas, tão somente, miti-

gados – que põe em risco a integridade de um indivíduo, que já se encontra

em situação de debilidade, pois depende de uma transfusão de sangue ou

hemoderivados para o restabelecimento de sua saúde, é enfrentar dilema

ético que irá depender dos valores pessoais de cada doador para garantir a

funcionalidade do sistema.

Em apertada síntese, a resolução bioética da questão perpassa pelo

conjunto de valores utilizados para responder a três questões fundamentais:

Quero? Devo? Posso? Ou seja, embora doadores extremamente imbuídos

de espírito verdadeiramente altruísta sejam impedidos de doar sangue, eles

assim o são por que são homens que praticam sexo com risco acrescido,

não

devendo

fazê-lo sob o risco de colocar em risco a saúde de outrem, razão

pela qual

não permite

a norma de vigilância sanitária que exerçam tal ativi-

dade cívica, considerando o interesse da coletividade.

Nossas cortes não passaram alheias à questão, tendo,

exempli gratia

, o

Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, seguindo a jurisprudência

predominante, proferido decisão emblemática quanto ao assunto:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZA-

ÇÃO POR DANO MORAL. ALEGAÇÃO DE TER HAVIDO

ATO DE DISCRIMINAÇÃO, POR PARTE DA ADMINISTRA-

ÇÃO PÚBLICA, POR NÃO TER SIDO PERMITIDO QUE O

AUTOR DOASSE SANGUE PELO FATO DE SER ELE HO-

MOSSEXUAL. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. A Admi-