

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 377 - 397, Maio/Agosto 2017
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Portanto, até o presente momento, permanece plenamente em vigor
a Portaria
nª 158/2016, do Ministério da Saúde, e a Resolução nª 34/2014,
da ANVISA, nas quais homens que tiveram relações sexuais com outros ho-
mens, ou com as parceiras sexuais destes, são considerados inaptos por 12
meses para doar sangue nos hemocentros e hospitais do país.
Destarte, os Serviços de Hemoterapia, públicos ou privados, estão
proibidos de receber sangue dos homens que declararem ter feito sexo com
outros homens nas entrevistas realizadas antes do procedimento de coleta
(triagem clínica), pelo período de 12 meses a partir da última relação sexual,
bem como as parceiras sexuais destes.
Evidencia-se, neste prisma, considerando não somente a agudez dos ar-
gumentos contidos na ADI, mas, sobretudo, os direitos alegadamente violados,
a imperiosa necessidade de se realizar, como metodologia, um cotejo entre as
opiniões empíricas da população acerca do tema, a evolução e fundamentação
científica das normas de vigilância sanitária e os direitos constitucionalmente
assegurados, objetivando, assim, aclarar a questão cientificamente.
Sendo assim, o processo de elaboração deste artigo ocorreu, justamen-
te, com base na verificação dos pontos de convergência de uma nova discus-
são, com um velho problema, no campo da triagem clínica de doadores de
sangue, que é permeado por um conflito ético.
Constitucional ou Inconstitucional?
Mesmo na atualidade, conforme o já constatado, a questão aqui tratada
permanece gerando insolúveis controvérsias tanto entre juristas e profissionais
da área da saúde que atuam nos serviços de hemoterapia, como na sociedade
em geral. A triagem clínica dos homens que fazem sexo com homens, bem
como das parceiras sexuais destes, é por vezes tida como clara configuração
de discriminação aos HSH
2
, clamando o ponto por uma análise objetiva, sem
qualquer submissão às paixões que envolvem o debate do tema.
Apenas como ilustração das opiniões empíricas, cabe transcrever de-
poimentos
3
de doadores, que adotam condutas diversas, por ocasião da tria-
gem a que são submetidos, de modo a que se inicie um raciocínio acerca da
utilidade da restrição contida nas aludidas normas de vigilância sanitária,
para a garantia da qualidade do sangue:
2 Homens que fazem sexo com homens.
3 O nome dos depoentes foi ocultado de modo a preservar a sua privacidade.