

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017
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diz] que, em qualquer sistema jurídico, uma norma é válida, enquanto uma
norma daquele sistema, somente em virtude do fato de que em algum tem-
po e lugar relevantes, algum agente ou agentes relevantes a anunciaram, a
praticaram, a evocaram, a reforçaram, a endossaram ou, de alguma forma,
se engajaram com ela. Não se pode usar como objeção à sua consideração
como lei o fato de que era uma norma aberrante, com a qual aqueles agen-
tes nunca deveriam ter se engajado. De modo inverso, se nenhum agente
relevante tivesse se engajado com ela, então ela não seria considerada como
uma lei, muito embora possa ser uma excelente norma, com a qual todos os
agentes relevantes deveriam ter se engajado sem reservas.”
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Por fim, uma razão pragmática ainda pode ser arrolada em favor do
positivismo jurídico. É que, ainda que a moral possa assumir traços objeti-
vos, pelo mero consenso ou por um processo de correção, quaisquer destas
avaliações serão sempre mais controvertidas e incertas do que a identificação
das normas jurídicas pelos critérios positivistas.
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Por isso, a independência
do Direito em relação à moral propicia mais segurança na prática jurídica,
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limitando as possibilidades de decisões arbitrárias e restringindo a liberdade
de escolha dos julgadores.
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3.2. A Motivação para o Ato
Ao se admitir que a razão seja capaz de justificar a verdade de deter-
minada proposição moral, uma questão não resta resolvida pelo discurso ne-
oconstitucionalista: é que, ainda que determinada proposição moral venha a
ser aceita e considerada correta, nada, absolutamente nada, garante que ela,
por si só, irá servir para uma atuação na mesma direção.
O que não resta explicado, portanto, é: como uma norma moral, ra-
cionalmente estabelecida (por intuição ou por construção) pode funcionar
como motivo suficiente (motivação direta) para determinar a conduta de
um agente? Logo, embora razões morais possam ser arroladas e cotejadas
para determinar o “acerto” de determinada conduta, o fator chave para a
52 GARDNER, John.
Legal Positivism: 5 ½ Myths
. The American Journal of Jurisprudence. Vol. 46, p. 200.
53 MacCORMICK, Neil.
Diritto, morale e positivismo giuridico
.
In
MacCORMICK, Neil
et
WEINBERGER, Ota.
Il Diritto come Istituizone. Milano: Giufreé, 1990, p. 157 a 179
Apud
DIMOULIS, Dimitri.
Positivismo Jurídico – In-
trodução a uma Teoria do Direito e Defesa do Pragmatismo Jurídico-Político
. São Paulo: Método, 2006, p. 186.
54 De fato, “é relativamente fácil afirmar que valem como ‘lei’ todos os imperativos aprovados pelo Congresso Nacional.
Mas como ter certeza sobre os comandos que vigoram se a validade se submete ao requisito de consonância com a digni-
dade humana ou qualquer outro [valor]?”. DIMOULIS, Dimitri.
Positivismo Jurídico – Introdução a uma Teoria do
Direito e Defesa do Pragmatismo Jurídico-Político
. São Paulo: Método, 2006, p. 145.
55 Idem, p. 186.