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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017

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proposições sintéticas relativas ao mundo objetivo dos fatos”.

35

As normas

escapam a estas duas esferas: não são nem empíricas nem tautológicas, e

portanto não podem ser fundamentadas à luz da única instância racional

sobrevivente: a razão teórica.

2.3. A Busca por um Princípio de Regência para a Teoria do Direito

Por todo o exposto, verifica-se que uma norma (moral ou jurídica)

somente pode ser entendida como ato de vontade, nunca como um produto

da razão teórica.

36

Ao contrário das puras descrições, que podem ser empiri-

camente controladas, qualquer prescrição é, necessariamente, o produto do

exercício de autoridade por um sujeito,

37

visando a determinados fins. Uma

teoria do Direito – que pretenda efetivamente ser uma teoria, e não uma

prática disfarçada –, apenas pode descrevê-lo; ela não pode, como o Direito

produzido pela autoridade jurídica (através de normas gerais ou individu-

ais), prescrever seja o que for.

38

Como consequência, o princípio de regência do Direito difere subs-

tancialmente do princípio de regência dos fenômenos não normativos, ou

seja, daqueles que não expressam um dever. Assim, enquanto as leis dos fe-

nômenos da natureza são edificadas com base no

princípio da causalidade

,

os acontecimentos normativos se apoiam em princípio diverso, a saber, no

princípio da imputação

.

39

Neste contexto, o

mundo natural

é entendido como o plano exis-

tencial (mundo físico) determinado pela ocorrência de um nexo necessá-

rio (princípio da causalidade), o qual o pensamento humano meramente

constata. De outro lado, repousa o

mundo cultural

, de caráter normativo,

explicável pelo princípio da imputação (relação de condição e consequên-

cia atribuída pelo homem), quando há descrição de uma relação específi-

ca estabelecida entre dois fatos diferenciados dos acontecimentos causais,

em virtude de ser essa relação alheia aos fatos que descreve.

40

Assim, ao

contrário da causalidade natural, a “causalidade normativa” (leia-se: a im-

35 ROUANET, Paulo Sérgio.

Ética Iluminista e Ética Discursiva

. In:

Habermas 60 Anos. Rio de Janeiro: Tempo

Brasileiro, 1981, p. 31.

36 KELSEN, Hans.

Teoria Geral das Normas

. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1986, p. 108.

37 VON WRIGHT, Georg Henrik.

Ser y Deber Ser

.

In:

AARNIO, Aulis

et alli

(Org.). La Normatividad del Derecho.

Barcelona: Gedisa Editorial, 1997, p. 93.

38 KELSEN, Hans.

Teoria Pura do Direito

. 2ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 82.

39 SGARBI, Adrian.

Hans Kelsen – Ensaios Introdutórios (2001-2005)

. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2007, p. 6 e 7.

40 Idem, p. 7.