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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017

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putação) encontra sua razão de ser apenas nas normas que vinculam de-

terminados fatos e que transformam as ações humanas em ações humanas

normativamente qualificadas.

41

Aqui, a distinção entre as normas jurídicas e as proposições formuladas

pela ciência jurídica assume especial relevância. Se a teoria do Direito tem por

objeto as normas jurídicas, as suas proposições são, no entanto – tal como as

leis naturais da ciência da natureza – uma descrição do seu objeto alheia aos

valores (

Wertfrei

). Quer dizer: essa descrição realiza-se sem qualquer referência a

um valor metajurídico e sem qualquer aprovação ou desaprovação emocional.

42

Se a razão humana é uma faculdade de conhecimento, por meio dela as normas

estabelecidas por atos de vontade podem ser conhecidas, mas não criadas.

43

As proposições formuladas pela ciência do direito, ao contrário das suas

normas, podem ser verdadeiras ou falsas,

44

ao passo que as normas de dever-ser,

estabelecidas pela autoridade jurídica, apenas podem ser válidas ou inválidas.

45

Na proposição jurídica não se diz, como na lei natural, que, quando A é, B

é, mas que quando A é, B deve-ser, mesmo quando B efetivamente não o seja.

Segundo Kelsen, “o ser o significado da cópula ou ligação dos elementos na

proposição jurídica diferente do da ligação na proposição jurídica ser produzi-

da através de uma norma estabelecida pela autoridade jurídica – através de um

ato de vontade, portanto –, enquanto que a ligação de causa e efeito, que na

lei natural se afirma, é independente de qualquer intervenção dessa espécie.”

46

3. Outras Razões para Adesão ao Positivismo Jurídico

Ainda que uma tentativa de reintroduzir uma reabilitação da filosofia

moral possa ser bem-sucedida, outras razões fortes podem ser arroladas a

favor de uma abordagem positivista da Teoria do Direito.

3.1. A Necessidade de uma Teoria sobre o Direito

Embora o positivismo jurídico seja, normalmente, vinculado às teses

não cognitivistas da filosofia moral, é impróprio reduzi-lo a tanto. Em pri-

41 KELSEN. Hans.

Teoria Geral do Direito e do Estado

, 3ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 64.

42 KELSEN, Hans.

Teoria Pura do Direito

. 2ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 89.

43 KELSEN, Hans.

Teoria Geral das Normas

. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1986, p. 10.

44 Neste particular, faz-se importante um alerta: tal como os fatos da ordem do ser não são quer verídicos, quer inve-

rídicos, mas apenas existem ou não existem, somente as

afirmações

sobre esses fatos podem ser verídicas ou inverídicas.

KELSEN, Hans.

Teoria Pura do Direito

. 2ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 83.

45 KELSEN, Hans.

Teoria Pura do Direito

. 2ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 83.

46 Idem, p. 87.