

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017
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da premissa de que questões morais podem ser discutidas a partir de
critérios racionais.
Haveria, portanto, segundo seus defensores, a possibilidade de com-
provar objetivamente a superioridade de certos valores morais ou, pelo me-
nos, indicar um procedimento correto para encontrá-los.
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Estamos, aqui,
diante de um
universalismo moral
(mais amplo ou mais restrito, conforme
a corrente teórica), posição que, em síntese, sustenta que a verdade de certas
normas morais pode ser reconhecida.
De acordo com um importante divulgador da vertente discursiva,
o projeto neoconstitucionalista trabalha com “a superação do fosso entre
ser e dever-ser, com o enfrentamento da fratura humeana e a consequente
possibilidade de justificação do juízo moral, abrindo a discussão racio-
nal do domínio normativo (...)”.
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A proposta neoconstitucionalista seria,
portanto, “fechar o abismo entre o
Sein
e o
Sollen
, entre os julgamentos
descritivos [de fato] e os prescritivos [de valor], e, em última análise, entre
vida e ciência, que desde Hume e sobretudo Weber, condenou as proposi-
ções normativas (organização da práxis) à inverificabilidade e à contingên-
cia da mera opinião.”
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Como consequência, as normas (morais ou jurídicas) não assegura-
riam meramente uma crença na legitimidade. Assim como o juízo teórico,
o juízo prático e seu produto (as normas) também ergueriam uma pretensão
de correção, que poderia ser independente e racionalmente avaliada.
18
Em
breve síntese: os sistemas normativos – no que nos interessa diretamente, a
moral e o Direito – seriam acessíveis à razão. Esta concepção, longe de cons-
tituir uma “terceira via” no discurso jurídico, representa apenas o retorno,
com ares de novidade, de uma velha conhecida: a escola do direito natural.
19
15 DIMOULIS, Dimitri.
Positivismo Jurídico – Introdução a uma Teoria do Direito e Defesa do Pragmatismo
Jurídico-Político
. São Paulo: Método, 2006, p. 191.
16 MAIA, Antonio Cavalcanti.
A Distinção entre Fatos e Valores e as Pretensões Neofrankfurtianas
.
In:
MAIA,
Antonio Cavalcanti (Org.). Perspectivas Atuais da Filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Lúmen Iuris, 2005, p. 14.
17 ROUANET, Sérgio Paulo.
Teoria Crítica e Psicanálise
. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1986, p. 286.
18 MC CARTHY, Thomas.
Introduction
.
In
: HABERMAS, Jürgen. Legitimation Crisis. Boston: Beacon Press, 1975,
p. X.
Apud
MAIA, Antonio Cavalcanti.
A Distinção entre Fatos e Valores e as Pretensões Neofrankfurtianas
.
In:
MAIA, Antonio Cavalcanti (Org.). Perspectivas Atuais da Filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Lúmen Iuris, 2005, p. 14.
19 Segundo Carlos Santiago Nino, uma dissecação das várias versões do direito natural demonstra as seguintes caracte-
rísticas desta escola jusfilosófica: i) uma tese de filosofia moral que sustenta a existência de princípios morais, que são
universalmente válidos e acessíveis à razão humana; ii) uma tese sobre o conceito de Direito, segundo a qual uma norma
ou sistema normativo não podem ser qualificados como “jurídicos” se contradizem ou não passam pelo crivo de tais
princípios.
In
Introducción al Análisis del Derecho
. Barcelona: Ariel Derecho, 1999, p. 28
Apud
STRUCHINER, Noel.
Algumas “Proposições Fulcrais” Acerca do Direito: O Debate Jusnaturalismo vs. Positivismo
.
In:
MAIA, Antonio
Cavalcanti
et alli
(Org.). Perspectivas Atuais da Filosofia do Direito, Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2005, p. 400.