

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 263 - 308, Maio/Agosto 2017
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social. Nessa esteira, ao lado da atuação oficial, fundada na soberania e na justi-
ça, existe outra, espontânea, desinteressada, baseada na caridade.
A função originária das Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha
era auxiliar o serviço de saúde das forças armadas. A rigor, trata-se ainda
de uma condição de reconhecimento das Sociedades Nacionais o fato de
serem habilitadas como tal junto às forças armadas de seu país, exceto
naqueles países que não possuem forças armadas. Graças a essa função
auxiliar é que as Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha entraram para o
direito internacional, tendo adquirido a imunidade nos campos de batalha
sob o emblema da cruz vermelha sobre fundo branco, à semelhança do
pessoal sanitário das forças armadas.
Note-se que a Cruz Vermelha não detém o monopólio exclusivo dessa
função auxiliar aos serviços de saúde oficiais. A Ordem de Malta ou os Mé-
dicos sem Fronteiras, por ex., também prestam tais serviços complementares
de saúde. Com o tempo, os serviços de saúde das forças armadas se desenvol-
veram e a Cruz Vermelha deixou de se dedicar exclusivamente a tal função
auxiliar, assumindo atividades próprias, como a administração de hospitais
civis, doação de sangue, escolas de enfermagem e assistência às vítimas de ca-
tástrofes naturais. Cite-se também a assistência aos prisioneiros de guerra e a
manutenção de uma estrutura de busca de desaparecidos, a cargo da Agência
Central de Pesquisas. Algumas atividades, inclusive, a Cruz Vermelha desen-
volve à revelia dos serviços públicos, pois se antecipa aos mesmos.
7.6. Autonomia
A Cruz Vermelha deve possuir uma autonomia suficiente perante os
poderes públicos. Exerce uma função de interesse público e complementar
a do Estado, notadamente a de auxiliar das forças armadas. Nesse sentido,
faz-se necessária uma colaboração tão estreita que, por vezes, desafia sua
autonomia. Seu desafio é justamente conciliar a natureza de instituição de
caridade privada com a disciplina militar exigida em campanha. Isso, po-
rém, não representa uma contradição.
Lembre-se que, desde a sua criação, a Cruz Vermelha permite que as
Sociedades Nacionais se organizem da forma que lhes for mais convenien-
te, desde que observem os princípios fundamentais da instituição, como a
independência e autonomia. E tal autonomia diante dos poderes públicos
deve ser suficiente para que seja mantida a confiança da população
vis-à-vis
sua obra. Os governos, mesmo que majoritários, sempre revelam um aspecto