

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 263 - 308, Maio/Agosto 2017
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igualmente neutros. O reconhecimento internacional e o prestígio da neutra-
lidade da Suíça, contudo, não têm comparação com nenhum outro país. A
neutralidade suiça existe desde 1515, após a batalha de Marignano
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, e foi ra-
tificada universalmente nos tratados que se seguiram ao Congresso de Viena
de 1815. Sobreviveu a duas grandes guerras que dilaceraram seus vizinhos.
Esse prestígio da neutralidade suíça, de certa forma, acaba sendo emprestado
ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha, tornando-o inviolável. Ademais,
se o dito órgão fosse formado por integrantes de vários países, a neutralidade
que seria reconhecida seria medida por aquela do país integrante de cuja
neutralidade mais se suspeita e não a média da de todos.
Já se pretendeu que a própria Cruz Vermelha gozasse de uma neutrali-
dade absoluta, independentemente da suíça, a ser respeitada por todos. E que
os integrantes das Sociedades Nacionais tivessem assim essa “nacionalidade
neutra”, simplesmente por pertencerem à Cruz Vermelha. Tal pretensão, to-
davia, tem se revelado ilusória. Na guerra, a relação entre os beligerantes é
rompida. O correio deixa de funcionar a contento e as próprias Sociedades
Nacionais da Cruz Vermelha não se comunicam. Aí vale então o prestígio da
neutralidade do Comitê Internacional de Genebra, não só para prestar assis-
tência às vítimas, como para intermediar a comunicação entre as Sociedades
Nacionais dos adversários no conflito.
6.7. Independência
A Cruz Vermelha deve manter-se independente de todo poder e li-
vre de qualquer influência. As razões para a Cruz Vermelha permanecer
independente dos poderes públicos são óbvias, a fim de poder exercer sua
atividade precípua, de natureza puramente humanitária. Estando aberta a
todos com boa vontade para ajudar as vítimas, sua eventual dependência dos
poderes políticos acabaria por afastar aqueles que discordam do governo.
Por outro lado, a neutralidade perante as potências beligerantes permite à
Cruz Vermelha atuar livremente.
Para as Sociedades Nacionais, que também prestam serviços complemen-
tares ao poder público e que dele recebem subvenções, tal independência se torna
mais importante. Já para o Comitê Internacional, esse problema não se apresenta
na prática, dada a neutralidade da Suíça e a tradição local de respeito à instituição.
De fato, o Comitê Internacional não possui recursos financeiros
significativos, dependendo muito de doações. Tal fonte financeira poderia
28 Vide nota 14 acima.