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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 263 - 308, Maio/Agosto 2017

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remédios ministrados aos feridos. A ajuda deve, portanto, ser proporcional

ao malogro da vítima. Revelar-se-ia desumano preterir alguém que requeira

cuidados urgentes por outrem com moléstia menos grave.

O princípio da igualdade informa que se deve tratar igualmente to-

dos: a igualdade entre os homens, porém, termina quando alguém apresenta

um sofrimento físico mais intenso do que o do outro. Aí se recorre, em

substituição, ao princípio da proporcionalidade, devendo ser feita a devida

distinção entre indivíduos na medida de seu sofrimento. Tal é a única distin-

ção lícita, sendo vedadas aquelas “de caráter desfavorável”, para usar o termo

pertinente empregado na Convenção de Genebra de 1949. Esse diploma, em

seu artigo 12ª, determina ainda que somente razões de ordem médica auto-

rizam a prioridade na ordem de cuidados.

No que toca ao princípio da proporcionalidade, cumpre distinguir a

noção de justiça da de caridade, eis que ambas o norteiam. Na verdade, os

ditos conceitos não se opõem. A rigor, “a justiça é virtude que dá a cada um

o que é seu, de acordo com o respectivo direito”, segundo Santo Agostinho

23

.

Já a caridade implica dar a cada qual o que necessita, segundo seu sofrimen-

to. Nessa esteira, a noção de justiça a nortear a Cruz Vermelha é a caridade,

não lhe interessando, por ex., punir culpados, o que já é uma das funções

mais importantes da justiça como instituição estatal. Assim, se um soldado

inimigo é vítima de mal maior do que um nacional, o dever da Cruz Verme-

lha é curar antes o primeiro.

Ultimamente, os povos têm procurado organizar seus governos de

forma racional. Ao tentar fazê-lo, acabam por desdenhar a caridade, na

crença de que os problemas que a reclamam devem ser resolvidos com a

organização mais racional dos serviços públicos e não com esmolas. Esse

pensamento, todavia, não reflete a orientação da Cruz Vermelha, que priori-

za a caridade. Para a mesma, o princípio resume-se no sentido de que “

l’aide

disponible sera repartie selon l’importance relative des besoins individuels

et suivant leur ordre d’urgence

24

.

6.5. Imparcialidade

O princípio da imparcialidade impõe à Cruz Vermelha agir sem favo-

recimento nem prevenção com relação a ninguém. A noção de imparcialida-

de parte, primeiramente, da ideia de parcialidade, sendo, pois, a sua negação.

23 Santo Agostinho, A Cidade de Deus, I, 19-25 e 31.

24 Pictet, Jean, obra citada, pag. 40.