

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 143 - 158, Maio/Agosto. 2017
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A passagem do sistema republicano para o imperial se dá justa-
mente em razão do cumprimento da vocação monárquica a que estava
destinada a sociedade romana. O Império foi construído, consciente ou
inconscientemente, pelo próprio exercício de poder dos romanos e pela
sua constituição que permitia, desde então, a glorificação da figura do
ditador como salvador da república.
IV – A apropriação da ditadura temporária pelos
pensadores modernos.
O modelo de ditadura temporária adotada pelos romanos foi objeto
de admiração por grande parte dos autores modernos, como Rousseau,
que entendia que somente se pode retirar o poder proveniente das leis
quando se tratar de se salvar a pátria e, nesses casos, que devem ser raros e
manifestos, protege-se a segurança pública por meio de um ato particular
que estipula uma pessoa para cuidar da república, no caso o ditador (Do
Contrato Social:2010).
Deveras, para Rousseau a suspensão das leis, de forma temporária,
não abolia a função legislativa porque o magistrado que assumia poderia
silenciar a lei, mas “
não podia fazê-la falar
”, isto é, tudo poderia fazer, exceto
legislar. Dessa forma, Rousseau enxergava a ditadura temporária romana
como uma forma de manutenção do bem maior que era a República.
Nesta mesma linha, Montesquieu reconhecerá na república romana
o modelo ideal de governo, justificando qualquer conduta para protegê-la
por afirmar que uma república sábia não deve arriscar nada que a exponha
à sorte ou ao azar: o único bem a que deve aspirar é a continuidade do seu
Estado (2002:72).
Note-se que Maquiavel (2008:97) não enxerga na queda da Mo-
narquia romana, com a ascensão dos patrícios ao poder, uma revolução
conservadora. Limita-se a defender a liberdade contra a arbitrariedade da
concentração do poder em uma só pessoa. Ora, como estamos vendo, esta
dicotomia entre liberdade e ditadura, na Roma antiga, não retrata a reali-
dade vivida, pois os plebeus foram mais livres sob a batuta dos reis do que
no início da República romana. A ascensão da plebe durante a república
se fará através de inúmeros embates e de forma progressiva, sobretudo com
o aumento do poder econômico desta classe e o enfraquecimento econô-
mico dos patrícios, o que gerará campanhas eleitorais maculadas com a
corrupção financeira.