

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 30 - 37, out. - dez. 2016
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Excesso de trabalho, autonomia profissional e, porque não admitir,
o próprio desinteresse em casos específicos, têm sido adversários astutos
e difíceis de derrotar. Fazer esse trabalho de “interessar” o juiz no estudo
e na pesquisa de matérias afins ao Direito é o grande desafio de todas as
Escolas Judiciais.
Nesse ano que passou, por exemplo, a demanda em massa foi dire-
cionada ao novo Código de Processo Civil, dentro de uma perspectiva de
pura necessidade, ao passo que os cursos oferecidos na área das Ciências
Humanas deixaram a desejar em termos de procura. Isso é preocupante
posto que os conceitos, principalmente nesse terreno, mudaram muito
depois da nossa Constituição, que está se aproximando dos trinta anos.
As relações afetivas se avolumaram em importância, o sexo deu lugar
ao gênero, os direitos sociais são cada vez mais descumpridos e a noção de
dignidade humana como principal referência dos valores fundamentais já
não tem os contornos que imaginou o nosso constituinte de 1988.
Devemos reconhecer, em verdadeiro mea culpa, que há juízes atu-
ando em segmentos criminais que não têm qualquer perspectiva de gêne-
ro, ou que ainda acham que o casamento tradicional de um homem com
uma mulher é a única maneira de acasalamento! Essa é a nossa realida-
de e enquanto perdurar tal
status
veremos posições de teratologia já não
admitidas pelo universo jurídico e pela realidade social que cerca a muitos
magistrados, tudo isso em quantitativo infinitamente superior ao desejado.
Há que se pensar, como solução, em modos de trazer o magistrado
para a Escola de forma continuada e permanente, fazendo com que os
conceitos que a sociedade tem alterado com tanta liquidez e velocidade
sejam, também por eles, a todo tempo repensados.
Tenho que o caminho não deve ser, necessariamente, o de tentar im-
plementar uma nova forma de pensar, mas trabalhar com esse juiz um pre-
liminar exercício de reflexão, destinado a demonstrar, pelo menos, que há
outras realidades que não aquela que o mesmo carrega no seu imaginário.
4 – A DIGNIDADE HUMANA: O PARADIGMA PRINCIPAL
Como já disse alhures, não creio em equações miraculosas para so-
lucionar todos os conflitos constitucionais que desaguam no nosso Judi-
ciário. Na técnica da interpretação há que se fazer exercícios nem sempre
de fácil indagação, principalmente do juiz que terá que pôr fim àquela
celeuma que lhe é apresentada em forma de litígio.