

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 188 - 194, out. - dez. 2016
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Com a República, esse "caráter instrumentalizador" é reforçado:
ampliam-se as desigualdades sociais inerentes à sociedade capitalista. Eu-
genio Raúl Zaffaroni reconhece que:
Os órgãos do sistema penal exercem seu poder militarizador
e verticalizador-disciplinar, quer dizer, seu poder configura-
dor, sobre os setores mais carentes da população e sobre al-
guns dissidentes (ou "diferentes") mais incômodos ou signifi-
cativos. (
Em busca das penas perdidas
-
Ed. Revan, 5ª. Ed.
).
O "controle social militarizado e verticalizado" constitui caracterís-
tica de todos os órgãos do sistema jurídico, talvez mais visível no sistema
penal. Grande parte dos juízes incorpora-se a essa prática ideológica do
controle social verticalizado, concretizando a negação dos direitos mais
elementares, aniquilando o compromisso com a garantia dos Direitos Hu-
manos. O Poder Judiciário passa a produzir um verdadeiro estado de ex-
ceção, um moderno estado de sítio.
Em precioso trabalho -
Rui Barbosa e Felisbelo Freire: o Estado
de Sítio em Debate
- o advogado e historiador Márcio Verani analisa "as
interpretações desses dois políticos da Primeira República em relação aos
dispositivos da Constituição de 1891 referentes ao estado de sítio. Num pe-
ríodo onde a medida de exceção foi decretada diversas vezes, as posições
divergentes refletem não somente as divisões políticas da época, mas os
projetos ideológicos mais amplos, que almejavam conformar a nova organi-
zação político-institucional, resultante da transição republicana."
Os governos do Marechal Floriano e do Marechal Hermes da Fonse-
ca, especialmente este, foram pródigos na decretação do estado de sítio,
com prisões mantidas mesmo após o termo da medida de exceção. E o Su-
premo Tribunal entendia que "os atos praticados na vigência do sítio não
poderiam ser objeto de qualquer demanda judicial enquanto não fossem
apreciados pelo Congresso.” O Supremo considerava que:
Ainda quando na situação criada pelo estado de sítio, este-
jam ou possam estar envolvidos alguns direitos individuais,
esta circunstância não habilita o Poder Judicial a intervir para
nulificar as medidas de segurança decretadas pelo Presiden-
te da República, visto ser impossível isolar esses direitos da
questão política, que os envolve e compreende.