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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 182 - 187, out. - dez. 2016

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pressiva do Estado ou do mercado), e do

empobrecimento do imaginário

,

que reduz a compreensão à percepção binário-bélico (amigo-inimigo), o

autoritarismo (gênero do qual o fascismo é apenas uma de suas espécies)

e suas manifestações concretas (os discursos de ódio e de intolerância, os

linchamentos físicos e morais, os ataques pessoais, a desconsideração do

outro, a fabricação de inimigos, etc.), que já se mostravam compatíveis

com a tradição em que está inserido o ator social brasileiro, ganham ainda

mais espaço tanto à direita quanto à esquerda da sociedade, nas mais

diversas camadas sociais, o que abrange tanto os pobres – vítimas pre-

ferenciais do poder penal – quanto as elites (aqueles que detêm o poder

econômico e/ou político).

Não causa surpresa, portanto, que as mesmas pessoas que defen-

dem os direitos fundamentais de seus “partidários” comemoram a viola-

ção dos direitos fundamentais dos seus adversários políticos ou de classe.

Em outras palavras: em tempos de dessimbolização e empobrecimento

imaginário, os fins justificam em meios, os direitos fundamentais deixam

de constituir óbices contra o arbítrio e se tornam descaráveis na luta con-

tra os inimigos.

Também não causa surpresa que os julgamentos penais, percebi-

dos como locais privilegiados da luta política, sofram o impacto do cres-

cimento/naturalização do autoritarismo. A jurisdição penal, saber-poder

estatal, torna-se cada vez mais autoritária quando passa a recorrer à força

em detrimento do conhecimento, ao desconsiderar as garantias constitu-

cionais e os limites éticos e legais à produção probatória, na construção

justa do caso penal posto à apreciação.

São também características da jurisdição penal autoritária:

a) a perda da importância do fato posto à apreciação do Poder Ju-

diciário: a jurisdição penal autoritária prioriza o fim de “defesa social” em

detrimento do fato atribuído ao imputado. Para tanto, há o resgaste de

categorias como a “periculosidade” e outras típicas do chamado “direito

penal do autor”. O processo penal deixa de funcionar como um meio de

reconstrução ética de fatos e se torna um instrumento de exclusão de

determinados indivíduos;

b) a incidência do “princípio do bem e do mal”, adequado ao modo

de pensar binário-bélico: a jurisdição penal autoritária parte da premissa

de que o indivíduo imputado é a encarnação de ummal e que a sociedade