

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 132 - 156, out. - dez. 2016
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apresentarmos os principais focos de luta pela terra em nosso país para
posteriormente analisarmos tais movimentos sob a perspectiva da Teoria
do Reconhecimento de Axel Honneth.
Inicialmente apresentar-se-á a ideia de que o primeiro foco de luta
pela terra no Brasil foram os Quilombos. Nunca deixando de lado a clara
busca pela liberdade, este movimento negro de fuga do regime escravagista
tinha como objetivo a procura por um espaço de organização, produção e
preservação da identidade sociocultural do negro
5
. Assim, é possível afir-
mar que as ocupações realizadas por esse movimento simbolizaram pela
primeira vez uma forma concreta de luta contra os proprietários de terras.
Sem deixar de lado a grande importância do movimento negro de
formação dos Quilombos, as principais lutas do camponês no Brasil inicia-
ram-se com a transição do regime político, com o fim do Império e o início
da República.
Nesse contexto, dois momentos históricos foram de extrema rele-
vância para uma verdadeira modificação na estrutura das relações cam-
ponesas. Inicialmente, a abolição da escravatura, em 1888, e posterior-
mente, a transferência das terras devolutas do patrimônio da União para
o patrimônio dos Estados.
A abolição da escravatura já era prevista pela elite brasileira desde
1850, quando foi criada, através de pressões do governo inglês, a lei Eu-
zébio de Queiroz, que extinguiu o tráfico negreiro. A Lei de Terras foi pro-
mulgada nesse mesmo ano e garantiu não apenas a manutenção da terra
nas mãos dessa elite, como também, o início da transferência do trabalho
escravo para o trabalho assalariado, sem prejuízo para o proprietário.
Até a edição da Lei de Terras em 1850, desde 1822, quando o regi-
me das sesmarias foi extinto, o principal meio de aquisição do domínio no
Brasil era através da posse. Assim, no referido lapso temporal, o número
de posseiros no Brasil cresceu de forma acentuada.
A Lei de 1850 teve como principal finalidade determinar a compra e
venda como a única forma de aquisição entre vivos da propriedade imóvel.
Tal determinação tinha a nítida intenção de afetar os camponeses, que,
como muito bem afirma JOSÉ DE SOUZA MARTINS, “
se deslocavam para
áreas ainda não concedidas em sesmarias aos
fazendeiros e ali abriam
suas posses
6
”.
Com o futuro fim da escravidão, a Lei de Terras preparou o
5 BALDEZ, Miguel Lanzellotti. Ob. Cit, p. 107.
6 MARTINS, José de Souza.
Os Camponeses e a Política no Brasil
, Ed. Vozes, Petrópolis, 1981, p. 42.