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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 114 - 127, out. - dez. 2016

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prática corrente nas ditaduras do século XX, consistente no desapareci-

mento forçado de pessoas. Há muitas pessoas desaparecidas no Brasil,

seja pela ação das forças repressivas, seja pela ação dos chamados ‘trafi-

cantes’. No México, estima-se que 25.000 pessoas desapareceram entre

2006 e 2012, em meio à versão mexicana da mesma sanguinária ‘guerra

às drogas’.

De um lado, policiais são autorizados, ensinados, adestrados e esti-

mulados, formal ou informalmente, a praticar a violência contra os ‘inimi-

gos’ personificados nos ‘traficantes’. De fato, quem atua em uma guerra,

quem é encarregado de ‘combater’ o ‘inimigo’, deve eliminá-lo. Jogados

no

front

dessa sanguinária guerra, policiais matam, mas também têm seu

sangue derramado. Do outro lado, os ditos ‘inimigos’ desempenham esse

papel que lhes foi reservado. Também são ensinados, adestrados e esti-

mulados a serem cruéis. Empunhando metralhadoras, fuzis, granadas e

outros instrumentos mortíferos disponibilizados pela guerra incentivado-

ra da corrida armamentista, matam e morrem, envolvidos pela violência

causada pela ilegalidade imposta ao mercado onde atuam.

Como afirma o Inspetor Francisco Chao, integrante da polícia civil

do estado do Rio de Janeiro e porta-voz da LEAP: “

A guerra, ao contrário

do que mostram os filmes, não é heroica. Ela é suja. Ela fede. Eu participei

de um filme. Participei de uma cena, que retratava a morte do herói do

filme. A cena foi muito real, muito bem feita. Foi filmada em uma favela.

Mas, ao final da cena, fiquei com a sensação de que faltava alguma coisa.

Faltava. O sangue cenográfico não fede. O sangue de verdade tem um

cheiro muito forte. Dentre as inúmeras razões por que sou a favor do fim

do proibicionismo, é que eu estou cansado dessa guerra. Eu gostaria mui-

to que essa insanidade, que essa guerra, que não interessa aos policiais,

que não interessa à sociedade, tenha fim. Estou muito cansado disso. Es-

tou muito cansado de ver policiais morrendo. Essa guerra é suja. Não tem

como mexer com sujeira sem sujar as mãos

9

.

A ‘guerra às drogas’ não é propriamente uma guerra contra drogas.

Não se trata de uma guerra contra coisas. Como quaisquer outras guerras,

é sim uma guerra contra pessoas – os produtores, comerciantes e consu-

midores das substâncias proibidas. Mas, não exatamente todos eles. Os

alvos preferenciais da ‘guerra às drogas’ são os mais vulneráveis dentre

9 Intervenção no 2º Seminário da LEAP BRASIL “Drogas: Legalização + Controle”, realizado em 24/11/2014 (http://

www.leapbrasil.com.br/noticias/informes?ano=2014&i=310&mes=11

).