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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 114 - 127, out. - dez. 2016

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Acusações e condenações por ‘tráfico’ constituíam então a segunda maior

razão de encarceramento quando considerados os crimes contra o patri-

mônio em conjunto, ou a primeira maior razão de encarceramento quan-

do considerados tais crimes isoladamente (o maior contingente de pre-

sos por crimes contra o patrimônio – acusados e condenados por roubo

qualificado – alcançava 25% do total de presos). Em dezembro de 2005, a

partir de quando começaram a ser fornecidos dados relacionando o nú-

mero de presos com as espécies de crimes, os acusados e condenados

por ‘tráfico’ eram 9,1% dos presos brasileiros; em 2010, eram 21%; em

2012, 26,9%. Entre as mulheres, a proporção de acusadas e condenadas

por crimes relacionados às arbitrariamente selecionadas drogas tornadas

ilícitas, em dezembro de 2014, se elevava a 64% das presas

11

. Esses per-

centuais podem ser ainda mais elevados. Levantamento relativo a junho

de 2015 indica que 38,9% dos 221.636 presos no estado de São Paulo (o

maior contingente do Brasil) são acusados ou condenados por ‘tráfico de

drogas’, proporção que se eleva a 70% entre as mulheres

12

.

Nesse ponto, vale mencionar mais um dos paradoxos que caracteri-

zam a política proibicionista: as prisões, abarrotadas de ‘traficantes’ são, ao

mesmo tempo, local de intenso uso das arbitrariamente selecionadas dro-

gas tornadas ilícitas. Relatório do próprio UNODC revela que prisões são um

ambiente de alto risco, no que se refere ao uso de drogas. Como acontece

extramuros, a maconha também é a droga mais comumente usada. Embo-

ra mencionando a limitação de dados disponíveis, o relatório do UNODC

afirma ainda que o uso de heroína nas prisões do mundo é muito superior

ao registrado entre as populações em geral, estimando que o percentual

de consumo recente (prevalência no último ano) de tal droga em prisões

variaria de 0,8 a 11,5%, enquanto em populações em geral essa variação

seria de 0,3 a 0,5%

13

.

Mas, voltando ao perfil dos preferencialmente atingidos pela ver-

são brasileira da ‘guerra às drogas’. Não só entre os presos, mas também

entre os mortos nessa guerra, as discriminações e o racismo se repetem.

11 Dados: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Departamento Penitenciário Nacional do Minis-

tério da Justiça:

http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/infopen_dez14.pdf.

International Centre for

Prison Studies:

http://www.prisonstudies.org

.

12 Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo:

http://www.sap.sp.gov.br/download_files/

pdf_files/levantamento_presosxdelitos.pdf.

13 Relatório do Secretariado do UNODC para a 59ª Sessão da Comissão de Drogas Narcóticas (CND): “World si-

tuation with regard to drug abuse”.

https://www.unodc.org/unodc/en/commissions/CND/session/cnd-documents-

-index.html.