

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 114 - 127, out. - dez. 2016
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Drogas: Legalizar para Garantir
Direitos Humanos Fundamentais
Maria Lucia Karam
Juíza de Direito (aposentada), presidente da Asso-
ciação dos Agentes da Lei contra a Proibição (LEAP
BRASIL).
A proibição e sua política de ‘guerra às drogas’, imposta nos dispo-
sitivos criminalizadores das convenções da Organização das Nações Uni-
das (ONU) e em leis internas dos mais diversos Estados nacionais, como a
brasileira Lei 11.343/2006, é, hoje, uma das maiores fontes de violações
a princípios assegurados em normas inscritas nas declarações internacio-
nais de direitos humanos e nas constituições democráticas.
Os dispositivos criminalizadores que institucionalizam a proibição
e sua política de ‘guerra às drogas’ partem de uma distinção feita entre
substâncias psicoativas tornadas ilícitas (como a maconha, a cocaína, a
heroína, etc.) e outras substâncias da mesma natureza que permanecem
lícitas (como o álcool, o tabaco, a cafeína, etc.). Não há qualquer pecu-
liaridade ou qualquer diferença relevante entre as selecionadas drogas
tornadas ilícitas e as demais drogas que permanecem lícitas. Todas são
substâncias que provocam alterações no psiquismo, podendo gerar de-
pendência e causar doenças físicas e mentais. Todas são potencialmente
perigosas e viciantes. Todas são drogas.
Tornando ilícitas algumas dessas drogas e mantendo outras na le-
galidade, as convenções internacionais e leis nacionais, como a brasileira
Lei 11.343/2006, introduzem assim uma arbitrária diferenciação entre as
condutas de produtores, comerciantes e consumidores de umas e outras
substâncias: umas constituem crime e outras são perfeitamente lícitas;
produtores, comerciantes e consumidores de certas drogas são ‘crimi-
nosos’, enquanto produtores, comerciantes e consumidores de outras
drogas são perfeitamente respeitáveis, agindo em plena legalidade. Esse