

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 94 - 102, out. - dez. 2016
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As “boas intenções” do MP contrariavam a Constituição e pode-
riam causar uma grave violação das liberdades individuais garantidas pelo
Estado de Direito. Numa democracia, o poder público somente está au-
torizado a realizar uma intervenção na vida de alguém nos momentos em
que a Constituição autoriza. É verdade que posições arbitrárias são ten-
tadoras e, muitas vezes, oferecem soluções facilitadoras que conquistam
rapidamente a simpatia da opinião pública. No entanto, quando o Poder
Judiciário se afasta de escolhas meramente ideológicas para decidir pau-
tado pela Constituição, o direito tem sua autonomia reforçada frente aos
constantes ataques da moralidade privada.
Se é verdade que as explicações decorrentes de nosso modo práti-
co de ser-no-mundo (o-desde-já-sempre-compreendido) resolvem-se no
plano ôntico (na linguagem da filosofia da consciência, em um raciocínio
causal-explicativo), também é verdadeiro afirmar que esse “modo ôntico”
permanecerá e será aceito como tal se – e somente se – a sua objetivação
não causar estranheza no plano daquilo que se pode entender como tra-
dição autêntica. Nesse caso, devidamente conformados os horizontes de
sentido, a interpretação “desaparece”. Em síntese, é quando ninguém se
pergunta sobre o sentido atribuído a algo.
Mas, se essa fusão de horizontes se mostrar mal sucedida, ocorrerá
a demanda pela superação das insuficiências do que onticamente obje-
tivamos. Trata-se do acontecer da compreensão, pelo qual o intérprete
necessita ir além da objetivação. Com efeito, estando o intérprete inseri-
do em uma tradição autêntica do direito, em que os juristas introduzem o
mundo prático sequestrado pela regra (para utilizar apenas estes compo-
nentes que poderiam fazer parte da situação hermenêutica do intérpre-
te), resposta correta advirá dessa nova fusão de horizontes.
Por isso o acerto de Dworkin, ao exigir uma “responsabilidade polí-
tica” dos juízes. Os juízes têm a obrigação de justificar suas decisões, por-
que com elas afetam os direitos fundamentais e sociais, além da relevante
circunstância de que, no Estado Democrático de Direito, a adequada jus-
tificação da decisão constitui um direito fundamental. Uma decisão ade-
quada à Constituição (resposta hermeneuticamente correta) será fruto de
uma reconstrução histórica do direito, com respeito à coerência e à inte-
gridade (exame da integridade legislativa e respeito à integridade das de-
cisões anteriores). Não haverá grau zero de sentido. A resposta adequada
à Constituição deverá estar fundada em argumentos de princípio e não