

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 94 - 102, out. - dez. 2016
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tação da resposta de cada caso deverá estar sustentada em consistente
justificação, contendo a reconstrução do direito, doutrinária e jurispru-
dencialmente, confrontando tradições, enfim, colocando a lume a funda-
mentação jurídica que, ao fim e ao cabo, legitimará a decisão no plano do
que se entende por responsabilidade política do intérprete no paradigma
do Estado Democrático de Direito.
3. O DIREITO DE OBTER RESPOSTAS CONSTITUCIONALMENTE ADE-
QUADAS EM TEMPOS DE CRISE DO DIREITO: A NECESSÁRIA CON-
CRETIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
Mutatis mutandis
, trata-se de justificar a decisão (decisão no sen-
tido de que todo ato aplicativo – e sempre aplicamos – é uma decisão).
Para esse desiderato, compreendendo o problema a partir da antecipação
de sentido
(Vorhabe, Vorgriff, Vorsicht
), no interior da virtuosidade do
círculo hermenêutico, que vai do todo para a parte e da parte para o todo,
sem que um e outro sejam “mundos” estanques/separados, fundem-se
os horizontes do intérprete do texto (registre-se, texto é evento, texto é
fato). Toda a interpretação começa com um texto, até porque, como diz
Gadamer, se queres dizer algo sobre um texto, deixe primeiro que o texto
te diga algo. O sentido exsurgirá de acordo com as possibilidades (hori-
zonte de sentido) do intérprete em dizê-lo, d’onde pré-juízos inautênticos
acarretarão graves prejuízos hermenêuticos.
Nessa perspectiva, é interessante analisar uma decisão do Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul (Apelação Cível nº 70054988266), que
indeferiu o pedido do Ministério Público para que um paciente, com o pé
necrosado, passasse por uma intervenção cirúrgica, já que o mesmo se
negava a sofrer a amputação do membro por preferir uma morte digna.
Na época em que tomou a decisão, o paciente se encontrava em pleno
gozo de suas faculdades mentais, conforme laudo psiquiátrico, tendo,
portanto, condições de tomar uma decisão a respeito de seu tratamen-
to médico. É verdade que o direito à vida, garantido no art. 5º,
caput
,
CF, e o princípio da dignidade humana, previsto no art. 1º, III, da CF, não
implicam um dever que obriga a pessoa a viver. O direito à vida, do qual
a Constituição trata, fala de uma vida com razoável qualidade. É verdade
que a vida é um bem indisponível e que, portanto, a prática da eutanásia
é considerada ilegal pelo ordenamento jurídico brasileiro. Contudo, a prá-
tica da ortotanásia não é considerada ilegal, permitindo que o indivíduo