

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 94 - 102, out. - dez. 2016
96
ria da norma, uma nova teoria interpretativa e, fundamentalmente, uma
teoria da decisão (teoria da validade). A pergunta que se coloca(va) era: de
que modo pode(ría)mos olhar o novo com os olhos do novo? Afinal, nossa
tradição jurídica esta(va) assentada em um modelo liberal-individualista
(que opera com os conceitos oriundos das experiências da formação do
direito privado francês e do alemão), em que não havia lugar para direitos
de segunda e terceira dimensões, tampouco as discussões hodiernas so-
bre direitos humanos. Do mesmo modo, não há uma teoria constitucional
adequada às demandas de um novo paradigma jurídico.
No intento de desenvolver uma teoria jurídica apropriada a esta
nova realidade temos gestado ao longo das últimas décadas a
Crítica Her-
menêutica do Direito
1
. Uma de nossas maiores preocupações é que a de-
cisão jurídica esteja em consonância com as exigências democráticas e
constitucionais, donde radica sua legitimidade. Então, a resposta jurídica
apresenta-se como uma decisão, que pressupõe responsabilidade políti-
ca, e não como uma escolha (livre) que deva ser avaliada pelas suas con-
sequências.
Os cidadãos, ao procurarem o Judiciário, acreditam que suas causas
serão apreciadas e julgadas à luz do Direito previamente estabelecido. Ou
seja, não é um direito criado
ex post facto
, mas aquele que tem raízes na
história institucional de sua comunidade. Não estamos a dizer que (pre)
existe um direito já pronto para ser aplicado, é que existe uma tradição,
uma narrativa que precisa ser reconstruída e que esta tarefa possui limites
e parâmetros.
Nesse sentido, entendo que há um direito fundamental de obter
uma resposta adequada à Constituição, que não é a única e nem a melhor.
Cada juiz tem suas convicções pessoais e sua ideologia própria, mas isso
1 Em síntese, a Crítica Hermenêutica do Direito (CHD) apresenta-se com uma matriz teórica de análise
do fenômeno jurídico. Fundamentalmente, move-se nas águas da fenomenologia hermenêutica, pela
qual o horizonte do sentido é dado pela compreensão (Heidegger) e ser que pode ser compreendido
é linguagem (Gadamer), onde a linguagem não é simplesmente objeto, e sim, horizonte aberto e es-
truturado e a interpretação faz surgir o sentido. Juntamente com estes pressupostos incorporam-se
aportes da teoria jurídica de Ronald Dworkin. Isto é explicitado amiúde em obras como
Hermenêutica
Jurídica e(m) crise, Verdade e Consenso e Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica
. A tarefa da
Crítica Hermenêutica do Direito – CHD é a de “desenraizar aquilo que tendencialmente encobrimos”
(Heidegger-Stein). Fincada na ontologia fundamental, busca, através de uma análise fenomenológica, o
desvelamento (
Unverborgenheit
) daquilo que, no comportamento cotidiano, ocultamos de nós mesmos
(Heidegger): o exercício da transcendência, no qual não apenas somos, mas percebemos que somos
(Dasein) e somos aquilo que nos tornamos através da tradição (pré-juízos que abarcam a faticidade e his-
toricidade de nosso ser-no-mundo, no interior do qual não se separa o direito da sociedade, isto porque
o ser é sempre o ser de um ente, e o ente só é no seu ser, sendo o direito entendido como a sociedade
em movimento), e onde o sentido já vem antecipado (círculo hermenêutico).