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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 70 - 95, Janeiro/Abril 2018

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8. Revisão do mito de que só o dispositivo da senten-

ça passa em julgado

Para definir o alcance da indiscutibilidade gerada pela coisa julgada,

a concepção atual do instituto não tem como subsistente a velha teoria de

CHIOVENDA, segundo a qual a parte da sentença que passa em julgado

seria apenas o seu

dispositivo.

Nessa ótica, os motivos e fundamentos da

conclusão do decisório ficariam fora da coisa julgada.

35

Entretanto, a corre-

lação que se tem de fazer é entre o

objeto do processo

e o

pronunciamento

que a sentença efetuou para solucioná-lo. Dentro do processo uma situação

jurídica litigiosa reclamou o acertamento judicial, de maneira que é esse

acertamento que, em nome da segurança jurídica, se sujeitará à força ou

autoridade da

res iudicata

.

Em termos práticos, o que deve ser pesquisado é aquilo, dentro do

pronunciamento judicial, que tem de ser conservado imutável para que “não

perca autoridade o que restou decidido”, como adverte JORDI NIEVA-FE-

NOLL. Explica o autor que é preciso apurar, no bojo do processo findo,

quais são as questões decididas que “conferem

estabilidade

à sentença” (g.n.).

O processo só cumprirá sua função de lograr a composição definitiva do lití-

gio se proporcionar garantia de permanência à solução de tais questões. En-

tão, para apurar qual parte do decisório adquiriu a indiscutibilidade própria

da

res iudicata

, “é necessário determinar quais pronunciamentos exigem

es-

tabilidade para não comprometer o valor do processo já concluído

36

(g.n.).

A operação, com esse objetivo, é singelíssima, muito mais prática e

casuística do que a luta infindável e pouco frutífera da doutrina antiga e

desgastada na busca da teorização complexa e da dogmatização sempre pro-

blemática, como tem ocorrido de longa data na tentativa de uma definição

científica e geral dos limites objetivos da coisa julgada.

Afinal, segundo as origens remotas do instituto, sempre se explicou

a coisa julgada pela simples finalidade de vetar, em nome da segurança jurí-

dica, a renovação do julgamento de uma causa já definitivamente decidida.

constitucional consagrada pelo STF em sede de controle concentrado de constitucionalidade, ainda que a ofensa se dê de

forma oblíqua” (STF, Pleno, Rcl. 1.987/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, ac. 01.10.2003,

DJU

21.05.2003, p. 33; Rcl. 2.363/

PA, Rel. Min. Gilmar Mendes, ac. 23.10.2003,

RSTJ

,

v. 193, p. 513.). Isto é, a coisa julgada será ofendida, ainda que a lei

declarada inconstitucional não tenha sido o fundamento do ato impugnado. Prevalecerá a eficácia do julgado mesmo que

apenas a tese adotada pelo STF esteja sendo questionada.

35 “O objeto do julgado é a conclusão

última

do raciocínio do juiz, e não as premissas; o último e imediato resultado da

decisão, e não a série de fatos, das relações ou dos estados jurídicos que, no espírito do juiz, constituíram os pressupostos de

tal resultado” (CHIOVENDA, Giuseppe.

Instituições de direito processual civil.

3.ed. São Paulo: Saraiva, 1969, v. I, n. 129, p. 411).

36 NIEVA-FENOLL, Jordi. La cosa giudicata: la fine de un mito.

Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile.

Ano 2014,

nº 4, Milano: Giuffrè, p. 1375.