

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 70 - 95, Janeiro/Abril 2018
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Advertia-se, contudo, que, se o fundamento fosse tão precípuo que,
abstraindo-se dele, o julgamento seria outro, faria ele praticamente parte do
dispositivo da sentença. Às vezes, no trato da
causa petendi
, reconhecia-se
que o juiz pudesse chegar a solucionar verdadeira questão com imediata
e inegável influência na resolução da lide. Em tais casos, mesmo fora do
espaço físico do dispositivo da sentença, teria sido julgada parte do mérito
da causa, e o pronunciamento revestir-se-ia da autoridade de coisa julgada.
30
7. Distinção entre motivo e
ratio decidendi
Uma corrente exegética, formada nos primeiros tempos de vigência
do Código de 1973, esboçou uma distinção entre
motivos
e
razões
da de-
cisão.
31
Argumentava-se que, ao fundamentar uma decisão, o juiz recorre à
análise dos acontecimentos que provocaram a eclosão da lide (
fatos jurídicos
litigiosos) e a outros que apenas servem como argumentos para convenci-
mento (
fatos simples
, úteis à busca da verdade).
À luz de tal distinção, a invocação do fato jurídico básico pelo juiz
seria a
razão de decidir
, que integraria a solução do pedido lançada no dis-
positivo da sentença e, assim, alcançaria, também, a força de
res iudicata
.
32
Já os fatos simples, aqueles que apenas servem à formação da convicção do
julgador, seriam os
motivos
da sentença que não se incluiriam na área de
incidência da coisa julgada.
Essa interpretação não foi, entretanto, a que mereceu a consagração
da maioria na doutrina e jurisprudência, enquanto vigorou o CPC/1973.
Em matéria de motivação da sentença, para os efeitos de exclusão da coisa
julgada, a tese que prevaleceu foi a de que a lei realmente não distinguia en-
tre fatos jurídicos e fatos simples. Todos, uma vez utilizados na argumenta-
ção do juiz, seriam
motivos
e não
objeto
do
judicium
e, por isso, não seriam
abrangidos pela autoridade de coisa julgada. As razões (ou fundamentos) da
sentença desempenhariam, de fato, importante papel na compreensão do
30 GRINOVER, Ada Pellegrini.
Direito processual civil
. São Paulo: J. Bushatsky, 1974, p. 91. A parte dispositiva que transita
em julgado deve ser entendida em “sentido substancial, e não formalista, de modo que abranja não só a parte final da
sentença, como também qualquer outro ponto em que tenha o juiz eventualmente provido sobre os pedidos das partes”
(STJ, 1ª T., REsp 900.561/SP, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 24.06.2008,
DJe
01.08.2008).
31 “Embora os motivos do julgamento não se revistam da condição de imutabilidade e indiscutibilidade, muitas vezes
esses motivos nada mais são que questões levantadas pelas partes e decididas, sobre as quais incide a preclusão máxima
(STJ, REsp 63.654/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 24.10.1995,
DJU
20.11.1995, p. 39.603).
32 CAMPOS, Ronaldo Cunha.
Revista Brasileira de Direito Processual
, v. III, p. 181. Deve-se ter como
objetivo
da coisa julgada
o
pedido
(relação jurídica material litigiosa e questões invocadas na petição inicial) e como
motivos
os fatos examinados, para
responder ao pedido, inclusive as questões jurídicas novas acrescentadas em razão da defesa do réu, que não se incluem
no campo do
iudicium
, a não ser quando requerida a declaração incidental.