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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 39 - 62, Janeiro/Abril 2018

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Além disso, cada um dos papéis pode padecer do vício da desemedida ou do

excesso: o papel contramajoritário pode degenerar em excesso de interveção

no espaço da política, dando lugar a uma indesejável ditadura do Judiciá-

rio; o papel representativo pode desandar em populismo judicial, que é tão

ruim quanto qualquer outro; e a função iluminista tem como antípoda o

desempenho eventual de um papel obscurantista, em que a suprema corte ou

tribunal constitucional, em lugar de empurrar, atrasa a história.

Felizmente, sociedades democráticas e abertas, com liberdade de ex-

pressão, debate público e consciência crítica, costumam ter mecanismos efi-

cientes para evitar esses males. Para que não haja dúvida: sem armas nem a

chave do cofre, legitimado apenas por sua autoridade moral, se embaralhar

seus papéis ou se os exercer atrabiliariamente, qualquer Tribunal caminhará

para o seu ocaso político. Quem quiser se debruçar sobre um

case

de pres-

tígio mal exercido, de capital político malbaratado, basta olhar o que se

passou com as Forças Armadas no Brasil de 1964 a 1985. E quantos anos no

sereno e com comportamento exemplar têm sido necessários para a recupe-

ração da própria imagem.

V. Conclusão

O presente ensaio procurou explorar alguns temas relevantes e recor-

rentes do direito constitucional contemporâneo, dentro de um cenário de

intensa circulação mundial de ideias, inúmeras publicações específicas e de

sucessivos encontros internacionais envolvendo acadêmicos e juízes consti-

tucionais de diferentes países. Cultiva-se, crescentemente, a imagem de um

constitucionalismo global. Para evitar ilusões, deve-se registrar, desde logo,

que ele não corresponde à criação de uma ordem jurídica única, com órgãos

supranacionais destinados a fazê-la cumprir. Essa é uma ambição fora de

alcance na quadra atual. Mais realisticamente, constitucionalismo global se

traduz na existência de um patrimônio comum de valores, conceitos e insti-

tuições que aproximam os países democráticos, criando uma gramática, uma

semântica e um conjunto de propósitos comuns.

As democracias contemporâneas são feitas de votos, direitos e razões.

Juízes e tribunais, como regra, não dependem de votos, mas vivem da pro-

teção de direitos e do oferecimento de razões. Nesse ambiente, Supremas

Cortes e Cortes Constitucionais desempenham três grandes papéis: con-

tramajoritário, quando invalidam atos dos Poderes eleitos; representativo,

quando atendem demandas sociais não satisfeitas pelas instâncias políticas;