Background Image
Previous Page  57 / 308 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 57 / 308 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 39 - 62, Janeiro/Abril 2018

57

marcos anteriores, aqui já citados, como

Bowers v. Hardwick

68

, que consi-

derou legítima a criminalização de relações íntimas entre pessoas do mes-

mo sexo, e

Lawrence v. Texas

69

, que superou este entendimento, afirmando

o direito de casais homossexuais à liberdade e à privacidade, com base na

cláusula do devido processo legal da 14

a

Emenda à Constituição. Em seu

voto em nome da maioria, o

Justice

Anthony Kennedy exaltou a “trans-

cendente importância do casamento” e sua “centralidade para a condição

humana”. Merece registro a crítica severa e exaltada do falecido

Justice

Antonin Scalia, acusando a maioria de fazer uma “revisão constitucio-

nal”, criar liberdades que a Constituição e suas emendas não mencionam e

“roubar do povo (...) a liberdade de se autogovernar”.

Obergefell

represen-

ta um contundente embate entre iluminismo e originalismo. De acordo

com algumas pesquisas, uma apertada maioria da população apoiava o

casamento entre pessoas do mesmo sexo

70

, significando que a decisão da

Suprema Corte, em verdade, poderia ser considerada representativa, ainda

que contra legislativa.

A verdade, porém, é que mesmo decisões iluministas, capazes de

superar bloqueios institucionais e empurrar a história, precisam ser segui-

das de um esforço de persuasão, de convencimento racional. Os derrota-

dos nos processo judiciais que envolvam questões políticas não devem ter

os seus sentimentos e preocupações ignorados ou desprezados. Portanto,

os vencedores, sem arrogância, devem continuar a expor com boa-fé,

racionalidade e transparência suas motivações. Devem procurar ganhar,

politicamente, o que obtiveram em juízo

71

. Já houve avanços iluministas

conduzidos pelos tribunais que não prevaleceram, derrotados por convicções

arraigadas no sentimento social. Foi o que se passou, por exemplo, em

relação à pena de morte. Em

Furman v. Georgia

72

, julgado em 1972, a Supre-

68 478 U.S. 186 (1986).

69 539 U.S. 558 (2003).

70 V. Justin McCarthy, U.S. Support for Gay Marriage Stable After High Court Ruling. In:

http://www.gallup.com/

poll/184217/support-gay-marriage-stable-high-court-ruling.aspx, 17 jul. 2015. A pesquisa realizada pelo Gallup, em que

se baseia a matéria, aponta um percentual de apoio de 58%. Pesquisa da Associated Press exibiu índices mais apertados:

42% a favor e 40% contra. Curiosamente, quando perguntados, na mesma pesquisa, se apoiavam ou não a decisão da

Suprema Corte, 39% disseram-se a favor e 41% contra. V. David Crary e Emily Swanson, AP Poll: Sharp Divisions After

High Court Backs Gay Marriage. In:

http://www.lgbtqnation.com/2015/07/ap-poll-sharp-divisions-after-high-court-

backs-gay-marriage/, 19 jul. 2015.

71 Gordon Silverstein,

Law’s Allure: how law shapes, constrains, saves, and kills politics

, 2009, p. 268: “O uso mais efetivo para as

decisões judiciais é quando elas funionam como um ariete, quebrando barreiras políticas e institucionais. Mas a omissão

em dar continuidade ao debate sobre o tema, utilizando a arte política da persuasão, coloca esses ganhos em risco se – e

quase inevitavelmente, quando – o Judiciário mudar, novos juízes assumirem e novas correntes de interpretação ou novas

preferências judiciais emergirem”.

72 408 U.S. 238 (1972).