

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 39 - 62, Janeiro/Abril 2018
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mundo, um fortalecimento do Poder Executivo
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. Nos últimos anos, porém,
em muitos países, tem-se verificado uma expansão do Poder Judiciário e,
notadamente, das supremas cortes. Nos Estados Unidos, esse processo teve
mais visibilidade durante o período da Corte Warren, mas a verdade é que
nunca refluiu inteiramente. Apenas houve uma mudança de equilíbrio entre
liberais e conservadores. O ponto aqui enfatizado é que, em certos contex-
tos, por paradoxal que pareça, cortes acabem sendo mais representativas
dos anseios e demandas sociais do que as instâncias políticas tradicionais.
Algumas razões contribuem para isso. A primeira delas é o modo como
juízes são indicados. Em diversos países, a seleção se dá por concurso públi-
co, com ênfase, portanto, na qualificação técnica, sem influência política.
Porém, mesmo nos Estados Unidos, onde a escolha tem uma clara dimensão
política, há um mínimo de qualificação profissional que funciona como
pressuposto das indicações.
Uma outra razão é a vitaliciedade, que faz com que juízes não estejam
sujeitos às circunstâncias de curto prazo da política eleitoral. Ademais, juízes
não atuam por iniciativa própria: dependem de provocação das partes e não
podem decidir além do que foi pedido. E finalmente, mas não menos im-
portante, decisões judiciais precisam ser motivadas. Isso significa que, para
serem válidas, jamais poderão ser um ato de pura vontade discricionária: a
ordem jurídica impõe ao juiz de qualquer grau o dever de apresentar razões,
isto é, os fundamentos e argumentos do seu raciocínio e convencimento.
Convém aprofundar um pouco mais esse último ponto. Em uma visão tra-
dicional e puramente majoritária da democracia, ela se resumiria a uma
legitimação eleitoral
do poder. Por esse critério, o fascismo na Itália ou o
nazismo na Alemanha poderiam ser vistos como democráticos, ao menos
no momento em que se instalaram no poder e pelo período em que tiveram
apoio da maioria da população. Mas a legitimidade não se mede apenas no
momento da investidura, mas também pelos meios empregados no exercício
do poder e os fins a que ele visa.
Cabe aqui retomar a ideia de democracia deliberativa, que se funda,
precisamente, em uma
legitimação discursiva
: as decisões políticas devem
ser produzidas após debate público livre, amplo e aberto, ao fim do qual se
forneçam as
razões
das opções feitas. Por isso se ter afirmado, anteriormente,
26 Esta concentração de poderes no Executivo se deu até mesmo em democracias tradicionais e consolidadas, do que é
exemplo a Constituição da 5ª República francesa, que retirou poderes da Assembleia Nacional e transferiu para um presi-
dente eleito. V. C. Neal Tate e Torbjörn Vallinder (eds.),
The global expansion of judicial power
, 1995, p. 519.