

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 39 - 62, Janeiro/Abril 2018
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São três os papéis desempenhados pelas supremas cortes e tribunais
constitucionais quando acolhem o pedido e interferem com atos praticados
pelo Poder Legislativo. O primeiro deles é o papel
contramajoritário
, que
constitui um dos temas mais estudados pela teoria constitucional dos dife-
rentes países. Em segundo lugar, cortes constitucionais desempenham, por
vezes, um papel
representativo
, atuação que é largamente ignorada pela dou-
trina em geral, que não parece ter se dado conta da sua existência. Por fim, e
em terceiro lugar, supremas cortes e tribunais constitucionais podem exercer,
em certos contextos limitados e específicos, um papel
iluminista
. Nos Esta-
dos Unidos, como a jurisdição constitucional é sempre vista em termos de
judicial review
(controle de constitucionalidade das leis), o acolhimento do
pedido envolverá, como regra, a invalidação da norma e, consequentemente,
de acordo com a terminologia usual, uma atuação contramajoritária. Como
se verá um pouco mais à frente, este papel contramajoritário poderá – ou
não – vir cumulado com uma dimensão representativa ou iluminista.
1.
O papel contramajoritário
Supremas cortes e tribunais constitucionais, na maior parte dos países
democráticos, detêm o poder de controlar a constitucionalidade dos atos
do Poder Legislativo (e do Executivo também), podendo invalidar normas
aprovadas pelo Congresso ou Parlamento. Essa possibilidade, que já havia
sido aventada nos
Federalist Papers
por Alexander Hamilton,
5
teve como
primeiro marco jurisprudencial a decisão da Suprema Corte americana em
Marbury v. Madison
, julgado em 1803.
6
Isso significa que os juízes das cortes
superiores, que jamais receberam um voto popular, podem sobrepor a sua
interpretação da Constituição à que foi feita por agentes políticos investidos
de mandato representativo e legitimidade democrática. A essa circunstância,
que gera uma aparente incongruência no âmbito de um Estado democrático,
a teoria constitucional deu o apelido de “dificuldade contramajoritária”
7
.
5 V. Federalist nº 78: “A constitution is, in fact, and must be regarded by the judges as, a fundamental law. It, therefore,
belongs to them to ascertain its meaning, as well as the meaning of any particular act proceeding from the legislative body.
If there should happen to be an irreconcilable variance between the two, that which has the superior obligation and valid-
ity ought, of course, to be preferred; or, in other words, the Constitution ought to be preferred to the statute, the intention
of the people to the intention of their agents”.
6 5 U.S. 137 (1803).
7 A expressão se tornou clássica a partir da obra de Alexander Bickel,
The least dangerous branch:
the Supreme Court at the
bar of politics, 1986, p. 16 e s. A primeira edição do livro é de 1962.