

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 282 - 304, Janeiro/Abril. 2018
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terminam em que hipóteses a autoridade judiciária local poderá exercer sua
jurisdição. Como a jurisdição é uma das funções do Estado, exercida – no
que se refere à aplicação da lei ao caso concreto – predominantemente pelo
Poder Judiciário, determinar os seus limites, por meio de normas sobre o
exercício da competência internacional, é decorrência direta da soberania
estatal.
33
Face à natureza de tais normas, questiona-se se a vontade das partes
pode derrogá-las.
A despeito dessa discussão, já há alguns anos, o direito convencional
e estrangeiro vêm admitindo a escolha do foro competente pela vontade das
partes. Contudo, até a edição do novo CPC, a matéria não era disciplinada
no Brasil. Ainda assim, a doutrina brasileira majoritária seguia a mesma
linha do direito estrangeiro, admitindo o acordo de eleição de foro, como
regra geral, sem fazer qualquer ressalva quanto aos casos em que se escolhia
o foro nacional em hipótese não prevista na legislação brasileira, tampouco
àqueles em que se escolhia foro estrangeiro em situação prevista na legislação
processual brasileira.
34
Essa também era a orientação do STF desde a década de cinquenta.
35
Em ação ajuizada no Brasil cujo objeto era um contrato de transporte que
continha cláusula elegendo o foro de Montevidéu, Uruguai, o STF decidiu
pela incompetência do Judiciário brasileiro, nos seguintes termos:
“O direito
brasileiro reconhece o foro contratual, salvo quando existir impedimento de
ordem pública”
.
36
33 Vide
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, E
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P
rocesso
C
ivil
B
rasileiro
, p. 11-14 (1947).
34 José Carlos Barbosa Moreira admite a autonomia da vontade nas duas situações. (José Carlos Barbosa Moreira,
Proble-
mas Relativos a Litígios Internacionais
,
T
emas
de
D
ireito
P
rocessual
,
5ª série, p.146 (1994). Chegando à mesma conclusão,
nem sempre abordando as duas hipóteses:
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,
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,
p. 121 e ss. (1955);
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,
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,
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III, p.102 e ss. (1944);
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,
D
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I
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P
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P
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G
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, p. 370-371
(1980); _
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,
C
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P
rocesso
C
ivil
, vol. I, p. 307 (1974).
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I
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arte
E
special
, vol. II, p. 312 (1977);
I
rineu
S
trenger
,
C
ontratos
I
nternacionais do
C
omércio
, p. 256-258 (1992);
O
siris
R
ocha
, C
urso de
D
ireito
I
nternacional
P
rivado
, p. 161 (1986);
J
acob
D
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,
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J
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D
olinger
e
K
eith
S. R
osenn
(O
rgs
.
),
A P
anorama
of
brazilian
L
aw
,
p. 353
(1992); A
rruda
A
lvin
,
M
anual
de
D
ireito
P
rocessual
C
ivil
, vol.1, p.
233-234, item nº 80 (1996)
D
onaldo
A
rmelin
,
Competência Internacional
,
R
evista
de
P
rocesso
2/148 (1976)
J
osé
I
nácio
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onzaga
F
ranceschini
,
A Lei e o Foro de eleição em Tema de Contratos Internacionais
. In:
J
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G
randino
R
odas
(C
oord
),
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ontratos
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nternacionais
, p. 116 (2002);
L
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G
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J
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Jornal Valor Econô-
mico. 23/10/2008. e
N
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A
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,
A Jurisprudência Brasileira sobre Contratos Internacionais: Lei Aplicável, Ordem Pública
e Cláusula de Eleição de Foro
, J
oão
G
randino
R
odas
(C
oord
),
C
ontratos
I
nternacionais
, p. 213 (2002). Defendendo
posição oposta, ou seja, negando a possibilidade de eleição de foro:
J
osé
I
gnácio
B
otelho
de
M
esquita
,
Da Competência
Internacional e dos Princípios que a Informam
,
R
evista de
P
rocesso
50/51, p. 52 (1988); e
C
elso
A
grícola
B
arbi
,
C
omentários
ao
C
ódigo de
P
rocesso
C
ivil
, vol. I, p. 302, (2008).
35 Note-se que esse julgado progressista, de 1957, é anterior às decisões já mencionadas da Suprema Corte norte-ameri-
cana, da Corte de Cassação francesa de 1985, da alteração da lei italiana de Direito Internacional Privado e até mesmo da
Convenção de Bruxelas de 1968.
36 E extrai-se do voto do Ministro relator: “(...) Não há como impedir às partes contratantes fixar o foro da ação senão
por impedimento de ordem pública. Penso como o saudoso Philadelpho Azevedo, que o art. 12 da Introduc. envolve
uma regra de simples proteção que o Estado dispensa aos cidadãos. Se o nacional pode ter interesse em abrir mão da
garantia oferecida pela lei brasileira, se aceita livremente a jurisdição estrangeira, não há como impedir essa aceitação. Daí