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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 240 - 258, Janeiro/Abril. 2018

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se afiguraria jurídico ou ético que uma das partes viesse – depois de ter livre-

mente convencionado, mas em função de resultado desfavorável – queixar-se

de suposto vício para o qual não teria atentado no momento próprio, tudo

conforme já tivemos oportunidade de observar

11

.

Além disso, a ideia de limite às convenções processuais ditado por

“direitos fundamentais” que se encontram eventualmente em parte da dou-

trina

12

não pode chegar ao ponto de fazer do processo uma espécie de meio

indisponível de solução de controvérsias, o que, em última análise, seria a

negação de seu caráter instrumental. Se as partes podem transigir no plano

material e, nessa medida, até mesmo abrir mão de posições jurídicas de

vantagem nessa esfera, e se podem fazê-lo sem a necessidade de qualquer pro-

cesso (portanto, com a ressalva da exceção representada pelos assim chama-

dos processos necessários), seria incoerente entender que elas não poderiam

voluntariamente transigir com posições emergentes da relação processual.

Aparentemente, essa ideia de existir uma espécie de núcleo processual

intangível – mal justificada em direitos processuais que seriam “fundamen-

tais” a ponto de se tornarem indisponíveis para as partes que querem deles

dispor – deriva, na realidade, do fato de que a solução do conflito pelo

processo envolve um terceiro, que, no caso, é um agente estatal, ao qual não

seria oponível a vontade das partes. Mas então o problema não é exatamente

de direitos processuais “fundamentais” e indisponíveis, mas sim de saber se

o que as partes convencionam pode atingir aquele terceiro, isto é, o juiz, ou,

como eventualmente se diz, saber se as convenções das partes podem inter-

ferir com poderes do juiz.

Embora seja forçoso reconhecer que a atuação do juiz é um limite a ser

considerado na celebração de negócios processuais, isso não justifica a asserti-

va singela de que as partes não podem dispor sobre poderes do agente estatal.

Nesse caso, justamente porque a atividade jurisdicional é um instrumento de

solução de controvérsias – o que faz com que o Estado seja diretamente inte-

ressado nessa superação, de que depende o escopo social consistente na pacifi-

cação social –, não há como recorrer ao argumento “privatista” (mas que nem

mesmo no Direito privado subsiste de forma incondicional) de que o contrato

só produzia efeitos entre os contratantes, sendo para o terceiro autêntica

res

inter allios.

A capacidade de o juiz de decidir de forma imperativa e de impor

11 Cf. nosso “Convenção das partes em matéria processual: rumo a uma nova era?”, in

Coleção Grandes Temas do

Novo CPC – Negócios Processuais

, coord. Antonio do Passo Cabral e Pedro Henrique Pedrosa Nogueira, Salvador,

Juspodivm, 2015, pp. 63/80.

12 Idem.