

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 209 - 223, Janeiro/Abril. 2018
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das situações de deficiência e disciplinassem a Tomada de Decisão Apoiada
26
,
que não tem regulamentação procedimental própria.
Encontra-se em tramitação o Projeto de Lei do Senado (PLS) nª
757/2015, que altera o CC, o CPC e o EPD, para dispor sobre a igualdade
civil e o apoio às pessoas sem pleno discernimento ou que não puderem
exprimir sua vontade, os limites da curatela, os efeitos e o procedimento
da tomada de decisão apoiada
27
. Observa-se que o mencionado PLS retoma
o discernimento como critério para aferição da capacidade.
A ausência de normas regulamentadoras da curatela e interdição de
pessoas com deficiência exige do intérprete atento trabalho, a ser feito à luz
dos princípios da CDPD, para que não se perverta o propósito de proteção
dessas pessoas em sua dignidade. É o que se constata, quando do confronto
do art. 4ª, III, do CC, norma geral a ser aplicada a todas as pessoas que não
podem exprimir sua vontade (tenham ou não deficiência
28
), com o disposto
no art. 84 c/c art. 85 e § 1ª do EPD, norma especial destinada às pessoas com
deficiência. A se considerar que (
i
) as pessoas referidas no art. 4ª, III, estão
sujeitas à curatela, conforme art. 1.767, I, do CC, e que (
ii
) a restrição esta-
belecida no art. 85 e § 1ª do EPD deve se aplicar às pessoas com deficiência,
chega-se à esdrúxula conclusão de que as pessoas com deficiência estariam
excluídas da proteção integral que a curatela pode propiciar às pessoas que
não podem exprimir sua vontade, e que inclui direitos existenciais, como os
atinentes às relações familiares.
Impõe-se, todavia, e até que o legislador se pronuncie, dar cumpri-
mento às normas existentes para fins de proteção e inclusão das pessoas com
deficiência, sob franca orientação constitucional da CDPD.
O CPC, diante do acanhamento do CC e do silêncio do EPD, parece
melhor se adequar às diretrizes da CDPD, ao ensejar uma aplicação individu-
alizada nas situações de deficiência, como se constata. O art. 749 do CPC esta-
belece que incumbe ao requerente da curatela especificar na petição inicial os
fatos que demonstram a incapacidade do interditando para administrar seus
26 A Tomada de Decisão Apoiada constitui um dos instrumentos de apoio das pessoas com deficiência, para prática de
atos da vida civil. É tratada no art. 1.783-A, introduzido no CC pelo EPD (art. 116).
27 Disponível em
www.senado.gov.br– Acesso em 20.12.2017.
28 A distinção entre causa transitória e permanente para caracterização da incapacidade relativa (CC, art. 4º, III) e aplicação
(ou não do EPD) está vinculada à noção de tempo e na prática certamente pode tornar-se tormentosa. Parece mais razoá-
vel, tanto ou mais do que perquirir a causa, verificar a situação individual, segundo um critério de aferição da
funcionalidade
,
conforme a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF, aprovada pela OMS-Organização
Mundial de Saúde, por meio da Resolução WHA54.21, de 22 de maio de 2001. Disponível em
http://www.periciamedicadf.
com.br/cif2/cif_portugues.pdf - Acesso: 30.08.2017. Sobre o assunto ver comentários ao art. 84 do EPD, BARBOZA,
Heloisa Helena e ALMEIDA, Vitor, in
Comentários ao Estatuto da Pessoa com Deficiência à Luz da Constituição da República
. Prelo.