

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 209 - 223, Janeiro/Abril. 2018
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1. A capacidade civil após o Estatuto da Pessoa com
Deficiência.
A compreensão do regime de capacidade civil introduzido no ordena-
mento brasileiro pelo EPD exige que a interpretação das leis por ele altera-
das, especialmente o CC, seja feita à luz das diretrizes da CDPD, sob pena
de perverter os altos propósitos da Convenção, em apego injustificado à
orientação anterior que, em verdade, afronta a Constituição da República.
É indispensável, de início, destacar alguns dados relativos à CDPD e
ao EPD, para que se dimensione adequadamente seu alcance e importância.
A Convenção Internacional das Nações Unidas sobre os Direitos das Pes-
soas com Deficiência (CDPD) é a primeira convenção do século XXI sobre
direitos humanos e contou com a participação ativa e sem precedentes
da sociedade civil
4
, em particular de organizações não governamentais e
representações de pessoas com deficiência, tendo assim um processo de
elaboração diferente do que é geralmente verificado em tratados sobre di-
reitos humanos. A CDPD atende diretamente 15% da população mundial,
cerca de um bilhão de pessoas
5
, que se encontram afetadas por algum tipo
de deficiência.
A também denominada Convenção de Nova York, adotada em 2006,
foi ratificada pelo Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo 186, de
09.07.2008, e promulgada pelo Decreto 6.949, de 25.08.2009; portanto, já se
encontra formalmente incorporada, com
status
de Emenda Constitucional,
ou seja, com força, hierarquia e eficácia constitucionais, ao ordenamento
positivo interno do Estado brasileiro, nos termos do art. 5ª, § 3ª, da Consti-
tuição da República. A CDPD está em vigor para o Brasil, no plano jurídico
externo, desde 31 de agosto de 2008, e, no plano interno, a partir de sua
promulgação pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009
6
.
Elaborado com base na CDPD, o Estatuto da Pessoa com Deficiên-
cia (Lei Brasileira de Inclusão), Lei 13.146/2015, destina-se a assegurar e a
promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liber-
dades fundamentais por pessoa com deficiência, visando a sua inclusão
social e cidadania, e vem atender uma população de quase 46 milhões de
4 DHANDA, Amita.
Legal capacity in the disability rights convention: stranglehold of the past or lodestar for the future?
in Syracuse
Journal of International Law and Commerce v. 34, n. 2, 2007, p. 429-462.
5 Dados que tomam como base as estimativas da população mundial de 2010. Relatório da Organização Mundial de Saú-
de (WHO) sobre pessoas com deficiência. Tradução disponivel:
http://www.pessoacomdeficiencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUNDIAL_COMPLETO.pdf Acesso em 23.08.2017.
6 Nesse sentido é expresso o parágrafo único, do art. 1º, da Lei 13.146/2015.