

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 196 - 208, Janeiro/Abril. 2018
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É, por exemplo, o método pelo qual se agruparam os casos em que
consumidores discutiam ser ou não legal a cobrança da assinatura básica,
por parte das Companhias Telefônicas para julgamento de acordo com o
regime dos arts. 1.036 e ss do CPC. Fatos como, por exemplo, a idade ou
a profissão dos consumidores autores das ações não eram idênticos. Isto é,
todavia, absolutamente irrelevante para efeitos de traçar os contornos da
hipótese de incidência do direito: para se saber se a assinatura básica era (ou
não) devida, pouco importam idade e profissão dos assinantes.
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Entretanto, há maneiras de uniformizar o entendimento dos Tribu-
nais muito mais refinadas, em que o que há de comum nos casos nada mais
é do que um núcleo pequeno, mas
fortemente significativo
, em torno dos
quais podem estar
fatos completamente diferentes
. Dando um exemplo ex-
tremo, poderíamos considerar contraditórias decisões em que se tivesse con-
cedido indenização de dez mil reais pela perda de uma perna e de cinquenta
mil reais por um dedo decepado.
O direito contemporâneo abriu-se para a sociedade, de modo a englo-
bá-la e a sua complexidade. Os
hard cases
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se multiplicam. Como observa-
mos antes, os ordenamentos jurídicos se aparelham com regras flexíveis, que
contêm conceitos vagos, cláusulas gerais, e os princípios jurídicos estão cada
vez mais presentes nos raciocínios jurídicos.
Esses parâmetros mais nublados, é evidente, comprometem a previsi-
bilidade, e podem chegar a inviabilizar a forma sistemática do direito, ideia
tão cara à forma de se ver o direito nos países de
civil law
. A não ser que haja
obediência aos precedentes.
O único modo de uniformizar a jurisprudência em casos mais com-
plexos, que ocorrem nos ambientes decisórios ditos antes “frouxos”, não
possíveis de serem tratados de forma coletiva, por não serem
idênticos
, é
adotarem-se métodos mais refinados de interpretação das decisões, de modo
a extrair-lhes o
core
, como fazem os povos de
common law
.
6) Como uniformizar a jurisprudência em casos que
não são absolutamente iguais
A ideia de que a vinculação a precedentes pode-se fazer usando o
método da
identidade essencial
(e não da
identidade absoluta
), poderia ser
12 Reclamação 4.982/SP, Primeira Seção, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 27.04.2011, DJe 04.05.2011.
13 Um
hard case
é um caso que deve ser resolvido à luz de regras e/ou princípios típicos de
ambientes decisionais frouxos
cuja
solução não está clara na lei, ou realmente não está na lei, e deve ser “criada” pelo Judiciário, a partir de elementos do
sistema jurídico.
Hard cases
podem dizer respeito a situações sociais em relação às quais esteja havendo, no plano dos fatos,
uma alteração de valores e/ou comportamental.