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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 164 - 195, Janeiro/Abril 2018

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ela própria, o germe da ação, ou é ela mesma, em determinado estágio de

sua fenomenologia, a ação. A força que dinamiza a atuação em juízo é a do

direito subjetivo posto em liça – “em posição de luta”, “em pé de guerra”,

como diziam pitorescamente os mais antigos. Já na ótica da ação abstrata,

chegou-se ao conceito pensando prescindir da cogitação quanto a preexistir

ou não um direito subjetivo (pelo menos suposto) que lhe dê conteúdo.

29

Este só mereceria atenção com vistas à demanda, a ação

proposta

.

Daí que se precisou construir uma ponte, uma ligação com o direito

material para explicar a demanda, à luz de uma teoria que dela não cogitara.

Estavam os juristas em uma petição de princípio a que foram conduzidos

per

tropo ragionare

: segundo um pitoresco jogo de palavras que mais de

uma vez se ouviu, estavam diante de uma pergunta feita pelo Direito Pro-

cessual a que só o Direito Material poderia responder... (A expressão era

repetidamente utilizada por Buzaid em suas conferências sobre o tema). Foi

essa singular perplexidade que tornou necessário o conceito de condições da

ação

30

e um outro, correlato e ainda mais discutível, que é o de

carência de

ação

como figura diversa da sua improcedência. Que, ao fim e ao cabo, mais

não faz do que reintroduzir no conceito de ação o liame de Direito Material

a tanto custo evitado, donde resulta a inutilidade dos esforços por distinguir

entre si as duas realidades – carência e improcedência – esforços que não

chegaram a resultado satisfatório. Quando falamos de coisas deste mundo,

seria impossível conceber o espírito sem que houvesse a potencialidade, ao

menos, de um corpo.

Assim, sem embargo da abstração e autonomia da ação, precisava ela

submeter-se,

quanto ao seu exercício

(isto é, com vistas à formulação da de-

manda concreta), a determinadas

condições

sem as quais ela não seria admi-

tida e, segundo a doutrina mais radical, talvez sequer existisse. O que passou

ao ensino dos juristas e à realidade da legislação, contudo, não foi a noção

de condições do regular exercício do direito de ação, mas condições da ação

29 Na verdade, ainda hoje há vozes importantes a defender que a ação “material”, romana, mesmo aquela do conceito

de Celso, pode ser cogitada na teoria do processo, se bem que em um plano de idéias diverso daquele ora considerado.

A ação material relaciona-se com a pretensão à tutela; a processual, com a pretensão à prestação jurisdicional: cf.,

e . g.

,

H

umberto

T

heodoro

J

r

..,

Curso

de Direito Processual Civil

, vol. I, p. 66 (item 51-b), 51ª ed., Rio de Janeiro, 2010. Sobre o

tema, com notável aprofundamento e vasta bibliografia,

G

uilherme

R

izzo

A

maral

,

“A polêmica em torno da ação de

direito material”, na

Revista Gênesis de Direito Processual Civil

, v. 33, 2005.

30 Já circulava anteriormente na doutrina o conceito de condições da ação:

v. g

.,

G

iuseppe

C

hiovenda

,

Instituições de Direito

Processual Civil

, vol. I, p. 66, trad. J. Guimarães Menegale, 2ª ed.. São Paulo, 1965 (com notas de Liebman e introdução

de Buzaid);

E

milio

B

etti

,

Diritto Processuale Civile italiano

, p. 153 e s., 2ª ed., Roma, 1936. Mas foi a teoria eclética que as

destacou e entronizou como categoria intermediária entre as questões processuais e as de mérito.