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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, p. 148 - 163, Janeiro/Abril 2018

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Essa garantia, todavia, não configura óbice à atuação de ofício. Assim,

eventual previsão legal sobre a possibilidade de o exercício da jurisdição

verificar-se sem manifestação do titular de interesse para o qual se destina a

tutela não ofenderia norma constitucional, pois a regra da inércia está pre-

vista exclusivamente na legislação ordinária.

Em síntese, a garantia da ação ou da inafastabilidade é constitucio-

nal, não a regra técnica da inércia. Não se admite é o legislador ordinário

opor óbices ao acesso à Justiça.

2

Mas nada impede, por questões de po-

lítica legislativa ou conveniência, seja desconsiderada a regra da inércia,

permitindo-se ao juiz, em determinadas situações, dar início ao processo

sem provocação da parte.

3

De qualquer modo, também em face de regras infraconstitucionais,

provocada a atividade jurisdicional, a resposta deve ater-se aos limites da de-

manda (partes, causa de pedir e pedido). Trata-se do princípio da correlação,

da congruência ou da adstrição (/CPC/2015, arts. 141, 490 e 492).

À luz desses dispositivos, portanto, está o juiz objetivamente

limitado aos elementos da demanda deduzidos na inicial. O pedido

formulado e os motivos apresentados pelo autor representam o âmbito

de atuação do julgador. Não pode ele omitir-se quanto a alguma pre-

tensão, conceder mais ou coisa diversa da pretendida, nem apresentar

razões diferentes daquelas expostas. Se o fizer, dar-se-á o fenômeno do

julgamento

citra, ultra

ou

extra petita

, o que poderá implicar a nulidade

da respectiva sentença.

4

Tais regras decorrem diretamente do princípio da demanda e da inér-

cia da jurisdição. Se ao juiz fosse permitido conceder mais do que fora pedi-

do ou fundamentar a decisão com razões diversas das deduzidas na inicial,

estar-se-ia possibilitando a tutela jurisdicional de ofício. Tudo o que excede

os limites objetivos da demanda implica atuação sem provocação.

2 A constitucionalidade da regra sobre cláusula compromissória, mediante a qual os tratantes comprometem-se a subme-

ter à arbitragem eventuais litígios (lei n. 9.307, de 23.9.96, art. 4.º), chegou a ser questionada no Supremo Tribunal Federal

(SE 5.206-Espanha (AgRg), rel.. Min. Sepúlveda Pertence), mas a alegação foi rejeitada, pois, no entender da Corte, a

manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória no momento da celebração do contrato e a permissão dada

ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o compromisso não ofendem o art. 5º, XXXV, da

Constituição Federal. Daí serem constitucionais também os artigos 6º, p.u., 7º e §§.

3 Essa conclusão não pode ser aplicada ao processo penal, cujo início, ao menos quanto às ações penais públicas, depende

da iniciativa do Ministério Público (CF, art. 129, inc. l). Nessa medida, em princípio, impossível a concessão de tutela

jurisdicional penal de ofício.

4 Em diversas oportunidades, ao relatar recurso de apelação, anulei a sentença porque não observada a regra da correlação,

com violação ao contraditório (Ap. 818.034-7, Jaú, 1º TACSP, 12ª Câm, j. 6.2.2001, v.u.; Ap. 927.001-9, SP, 1º TACSP, l2.ª

Câm., j. 21.11.2000, v.u.). Também já reconheci a nulidade apenas de um dos capítulos da decisão, porque concedida tutela

não pleiteada adequadamente (Ap. 822.770-7, São Paulo, l.º TACSP, 12.ª Câm., j. 29.5.2001, v.u.).