

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 398 - 429, Maio/Agosto 2017
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acabando por conferir-lhe um viés de subjetividade capaz de comprometer
diretamente a veracidade da situação fática mais tarde representada.
Assim, embora não se admita mais falar-se na adoção de uma verdade
meramente formal, trabalha-se com o conceito de verdade factível, isto é,
uma aparência da verdade, uma verossimilhança que se constrói no processo
através da interação entre os sujeitos processuais por seu discurso e fortifica-
-se na exata medida em que se oportuniza o contraditório dentro da lide, até
o grau máximo de aproximação dos fatos.
Tem acerto dizer-se, portanto, que a verdade real jamais será obtida
dentro do processo. Todavia sua busca deve servir de escopo para que os su-
jeitos processuais alcancem a própria finalidade do feito, que é a pacificação
social através da composição do conflito, função precípua da jurisdição.
Nessa toada, destaca-se o caráter publicista do processo, ou seja, sua
vertente de interesse coletivo, voltada à distribuição de justiça e a um com-
promisso do Estado de manter a sociedade num patamar de tranquilidade.
A busca da verdade real seria, pois, instrumento de realização desse dever
estatal, considerando que a afinidade entre a verdade dos autos e a realidade
fática oportunizaria ao órgão incumbido de jurisdição a concretização satis-
fatória e justa de sua missão.
Cuida-se de elemento indispensável à legitimação da autoridade da
decisão judicial frente ao meio social, pelo que interessa, em grande parte,
ao prolator de tais vereditos, o Estado-Juiz, representado pela figura do ma-
gistrado, mas não só a ele, como bem observou o Novo Código de Processo
Civil brasileiro ao atribuir às partes e a terceiros deveres de cooperação,
lealdade e boa-fé para a construção da verdade nos autos.
Por esse mesmo caminho, o sistema jurídico-processual moderno
rompe com a dicotomia de processo dispositivo e inquisitivo para adotar
a lógica de um modelo cooperativo, em que nem juiz, nem litigantes se
anulam, e sim atuam de maneira dialógica para a justa composição da lide.
Baseia-se a nova orientação de divisão de tarefas no processo por vieses so-
ciais, lógicos e éticos, decorrendo do primeiro o interesse comum que ampa-
ra a nova atuação do magistrado como sujeito ativo da relação processual.
Não mais se concebe no processo civil a existência de um juiz passivo
diante dos rumos da ação, razão pela qual o próprio ordenamento confere
ao magistrado poderes amplos de instrução destinados à busca da verdade
real no processo e que estão concentrados, primordialmente, nas disposições
do artigo 370 do Novo Código de Processo Civil.