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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017

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8.2.1. A “Verdade” das Proposições

Após se decompor cada um dos argumentos em proposições, deve

a razão buscar identificar o acerto (ou a verdade) de cada uma delas, sem

considerar as suas relações recíprocas. De fato, as proposições que não po-

dem ser testadas ou falseadas não valem para grandes coisas.

118

Imagine-se o

seguinte argumento:

Exemplo:

Proposição A:

A taxa de homicídios no Brasil é ex-

tremamente elevada.

Proposição B:

A pena de morte é uma

medida eficaz para a redução do número de homicídios.

Con-

clusão:

A pena de morte deve ser adotada no Brasil.

Para se afirmar a verdade da

proposição A

, faz-se necessário um amplo

estudo acerca da violência no país. Devem ser elaboradas, por exemplo, estatís-

ticas complexas em que conste o número de mortes por porção de habitantes.

Deve, ainda, ser verificado se, em outros países, as taxas de homicídios não

são mais altas do que aqui. Ainda assim, a expressão “extremamente elevada”

nada nos diz sobre qual seria a taxa tolerável de homicídios, nem mesmo se há

ou não um uma taxa deste tipo. Em qualquer caso, afirmar a “correção” desta

proposição será uma tarefa complicada, ou mesmo impossível.

Noutro giro, para se afirmar a verdade da proposição B, deve ser

verificado se, nos países em que se adota a pena de morte, as taxas de

homicídios são menores do que aqui. Melhor ainda se a pesquisa for feita

em países que passaram a adotar a pena de morte. Neste caso, será possível

verificar, através de dados quantitativos, a redução ou não do número de

homicídios após a introdução da medida. Por fim, será necessário verificar

se não foram outras causas que serviram de estímulo à redução da taxa de

homicídios, que não à adoção da pena capital, expressando a proposição,

na verdade, uma mera coincidência.

Diante do exposto, verifica-se que o papel da razão em

questões prá-

ticas

não é tanto definir o “acerto” da proposição, mas sim problematizar

a sua construção. Qualquer modalidade de argumento (ou, pelo menos, a

maioria deles) envolve, pressupõe ou gira em torno de algumas proposições

essenciais que, em grande medida, não são em si prováveis, demonstráveis

ou confirmáveis em termos de razões complementares.

119

118 SAGAN, Carl.

O Mundo Assombrado pelos Demônios

. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 208.

119 MacCORMICK, Neil.

Argumentação Jurídica e Teoria do Direito

. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 346.