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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017

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A atividade de interpretação, entendida como aplicação e, por con-

sequência, como criação do Direito, é uma atividade de atribuição de sen-

tido a uma norma jurídica, consistindo, pois, numa disputa de significado

realizado por vários atores sociais especializados.

138

Após identificar as

possibilidades de aplicação que a norma jurídica oferece, a autoridade

competente deverá atribuir o sentido que entende ser o correto. Nesse sen-

tido – e apenas nesse sentido –, é possível extrair o único sentido correto

de uma norma jurídica.

Note-se, de início, que a autoridade competente não está juridicamen-

te proibida de escolher qualquer das possibilidades indicadas pelo ordena-

mento jurídico. A autoridade pode, em princípio,

139

simplesmente impor a

decisão que entende correta, sem sequer ouvir os sentidos reclamados pelos

demais interessados: a decisão estará

fundamentada

, mas não

justificada

.

De outro lado, a autoridade competente pode, antes de impor a

sua decisão, ouvir as

razões

apresentadas por todos ou alguns dos atores

sociais interessados. Estabelece-se, neste caso, um processo argumentativo,

anterior à decisão, que serve, nas sociedades em que o ideário democrático

é bem-estabelecido pela prática, para legitimar a decisão jurídica: além de

fundamentada

, a decisão estará

justificada

.

Assim sendo, uma vez que o processo argumentativo tem por finali-

dade justificar a decisão, deve ser fornecida uma definição do que se entende

por

justificação

. Quando uma decisão jurídica estará devidamente justifica-

da? Desde logo, alerta-se que não se pode aceitar aqui a tese de que a justifi-

cação consista em demonstrar a ancoragem racional da decisão no contexto

da ordem jurídica em vigor.

140

Em primeiro lugar, se uma decisão jurídica foi proferida dentro dos

limites normativos, não se pode falar, propriamente, em justificação, ma-

téria atinente à prática. No plano de análise estritamente teórica, é melhor

invocar uma categoria produzida especificamente pela teoria do Direito:

a fundamentação. Por isso, a ancoragem racional nada mais é que a iden-

138 SGARBI, Adrian.

Teoria do Direito (Primeiras Lições)

. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, no prelo, p. 584.

139 Obviamente, nos sistemas em que a prática do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal está razoa-

velmente assentada, é difícil que isso venha a ocorrer. Não obstante, mesmo nos sistemas em que normas desta natureza

integrem a estrutura do Direito Positivo, a abertura ao procedimento argumentativo não obriga que a autoridade com-

petente os observe. Esta necessidade decorre de uma construção social acumulada, e não de uma simples previsão num

documento normativo.

140 É o que sugere, por exemplo, Robert Alexy.

In:

Teoria da Argumentação Jurídica

. São Paulo: Landy, 2001, p. 269.