

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 309 - 347, Maio/Agosto 2017
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tiva). É simplesmente impossível resolver esse conflito normativo através
de um ato racional, de puro conhecimento. Esse conflito somente pode
significar que a autoridade competente pode optar, por meio de uma aná-
lise estritamente política: i) por punir quem praticar a conduta; ou ii) por
premiar que praticar a conduta.
Por fim, nas antinomias de terceiro tipo (antinomia
parcial-parcial
)
as normas em conflito têm o seu âmbito de incidência em parte igual e em
parte diferente. Um exemplo: enquanto uma norma jurídica
N¹
proíbe as
condutas
C¹
e
C²
, uma (outra) norma jurídica
N²
autoriza as condutas
C²
e
C³.
No que diz respeito à conduta
C²
, somente 02 (duas) possibilidades res-
tam abertas para a autoridade competente: i) ou a proíbe; ii) ou a autoriza.
Como consequência, um conflito entre normas jurídicas do tipo
total-total
ou
parcial-parcial
somente poderá ser logicamente corrigido pe-
los critérios hierárquico e cronológico. Pelo critério da hierarquia, reputa-
-se inválida uma norma jurídica contrária a outra norma jurídica, quando
esta forneça o fundamento de validade daquela. Todavia, se as normas em
conflito ostentam a mesma hierarquia – ou seja, retiram o seu fundamento
de validade de uma terceira norma comum –, resolve-se o conflito através
do critério cronológico, considerando-se que a norma mais recente tenha
revogado a norma mais antiga.
Por outro lado, se ambas as normas em conflito tiverem origem idên-
tica, o conflito não poderá ser resolvido no âmbito da interpretação, mas tão
somente no âmbito da criação. Visto que interpretação das normas jurídicas
é conhecimento do direito, e o conhecimento do direito não pode produzir
normas jurídicas (mas apenas a vontade),
86
o órgão aplicador poderá apenas
decidir, num ato de vontade, pela aplicação de uma ou de outra, pelo que
permanece a existir, no plano estritamente normativo, o conflito entre am-
bas. Nesse caso, não será possível identificar, através da razão,
87
o resultado
jurídico específico (ou, como querem alguns, a única resposta possível), de-
pendendo o resultado de um ato de vontade que crie o Direito.
6. Por uma Teoria Pura dos Princípios
Mantida a epistemologia positivista e suas categorias fundamentais,
caminha-se agora para compatibilizar o reconhecimento dos princípios
86 KELSEN, Hans.
Teoria Pura do Direito
. 2ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 392.
87 Este é um dos principais problemas das denominadas teorias pós-positivistas. Em regra, a aplicação da norma positi-
vada ou de determinados “valores jurídicos” decorre, exclusivamente, de uma escolha arbitrária, falseada por argumentos
retóricos. Todavia, diante do objeto do presente trabalho, esta crítica ficará reservada a uma outra oportunidade.