

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 263 - 308, Maio/Agosto 2017
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corrente da sua reputação moral, não é desprezível, talvez até proporcional
à sua falta de força física.
4. A QUESTÃO DOS EMBLEMAS
A ideia de usar uma identificação para as pessoas envolvidas no
serviço médico e sanitário das forças armadas se revela genial e surgiu logo
em 1863, na reunião do Comitê dos cinco fundadores da Cruz Vermelha,
entre eles Henry Dunant. Até então, o símbolo identificador do pessoal
médico e sanitário em batalha variava de país para país e geralmente não
era conhecido pelos combatentes. Resultado disso é que os socorristas
eram frequentemente alvejados em campo de batalha, enquanto tentavam
recolher os feridos, independentemente da deslealdade do atirador, pois
eram tomados por combatentes.
O símbolo da Cruz Vermelha sobre fundo branco foi aprovado pe-
los signatários da 1º Convenção de Genebra, de 1864. Tratava-se de um
emblema de fácil reconhecimento à distância. Representava também a
bandeira da Suíça com as cores invertidas, o que não enfrentou a oposi-
ção de nenhuma das partes contratantes, pois a neutralidade da Suíça era
reconhecida desde o Renascimento e gozava de grande autoridade moral
na Europa
14
. É claro que, da parte de Henry Dunant, havia uma influência
da concepção de caridade própria do cristianismo, dada a sua profunda
educação religiosa. Mas naquela 1º Convenção de Genebra só havia países
cristãos à mesa, e isso não foi óbice.
Ficou assim acordado que o emblema da cruz vermelha identificaria
universalmente, no campo de batalha, as ambulâncias e o pessoal médico,
gozando estes de neutralidade. A violação a essa neutralidade consistiria em
grave ofensa ao direito internacional, sendo ainda um perigo para a própria
noção de proteção que o referido signo importa. Aliás, o disfarce, como
aquele ocorrido, por ex., no episódio do “cavalo de Troia”, hoje provavel-
mente não prosperaria, pois existe maior interesse geral no emprego correto
da identificação de neutralidade.
Na guerra russo-turca de 1876-1878, travada nos Balcãs pela libertação
da Bulgária, o pessoal médico do exército otomano passou a usar, unilate-
ralmente, o símbolo do crescente vermelho em fundo branco para a mesma
finalidade. Sua alegação era irrepreensível, pois se tratava de um país muçul-
14 A neutralidade suíça tem origem após sua derrota na batalha de Marignano (1515), travada na Lombardia contra as tro-
pas francesas, na qual seu exército perdeu 14 mil soldados. No Congresso de Viena de 1815 tal neutralidade foi ratificada
pelas potências vencedoras de Napoleão.