

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 90-106, Janeiro/Abril 2017
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relevância probatória, justamente porque indireta, subtraindo da imediação
seu maior trunfo: a avaliação da credibilidade do declarante
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e da veracidade
do declarado por meio da interação comunicacional. De igual sorte, compro-
mete o exercício do contraditório, na medida em que impede ou ao menos
dificulta significativamente o processo dialético na formação da prova.
Algumas ponderações recomendam a exclusão do testemunho indire-
to do rol de meios de prova legítimos e válidos: a) falta de percepção direta
da pessoa quanto ao fato a ser provado; b) falta de impressão precisa quanto
ao fato a ser provado; c) falta de capacidade da testemunha em descrever de
forma precisa a sua impressão; e, d) falta de sinceridade da testemunha em
relação ao fato a ser provado.
O enfrentamento dessa questão no Direito americano é bastante vasto,
tendo em vista o fundado receio de que a apresentação de uma prova nessas
circunstâncias no
grand jury
possa induzir ou mesmo permitir a manipula-
ção dos jurados durante o julgamento, principalmente porque se tratam de
jurados leigos. Ao mesmo tempo, o testemunho indireto é menos solene que
o testemunho direto, frusta a intensidade do exame cruzado da testemunha
(
cross examination
) e exibe uma grande probabilidade de desconfiança.
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Já no Direito italiano, para que o testemunho indireto possa ser vali-
damente valorado pelo juiz por ocasião do julgamento, é indispensável que
a testemunha indireta identifique a fonte do seu conhecimento, assim como,
se houver requerimento de uma das partes, o juiz é obrigado à determinação
da oitiva da fonte originária.
22
É nessa esteira que
C
omoglio
,
ao enfrentar o tema, indica que o tes-
temunho indireto pode ser livremente utilizado pelo juiz, no âmbito do seu
prudente arbítrio, o qual deverá concorrer com outros elementos de prova
objetivos e concordantes, capazes de sufragar sua credibilidade.
23
20 M
alan
prossegue seu escólio asseverando que
a falta de confiabilidade do
hearsay
é inferida a partir de uma série de fatores:
(
i
) a declaração original com frequência é prestada sem qualquer solenidade ou formalidade, em especial o juramento de dizer a verdade; (
ii
)
o declarante original não pode ser submetido ao exame cruzado da parte processual prejudicada pelo teor da declaração; (
iii
) juiz e os jurados
não podem observar o comportamento do declarante original no momento em que prestou as declarações
(MALAN, Diogo Rudge.
Direito
ao confronto.
.., cit., p. 54).
21 Em posição divergente segue
M
esquita
, para quem a
hearsay rule
apresenta-se autônoma de uma fixação epistemológica
da relação entre as provas e os fatos, centrando-se nos deveres e direitos das partes na produção de prova, em particular,
a exigência do
cross-examination.
Por seu turno, a imediação, em sentido formal, sendo também um princípio da produção
de prova, tem a sua raiz e núcleo na relação bipolar entre o tribunal e a prova
(MESQUITA, Paulo Dá.
A prova do crime
e o que se disse antes do julgamento: estudo sobre aprova do processo penal português, à luz do sistema norte
-americano.
Coimbra: Coimbra, 2011
, pp. 294-296).
22 TONINI, Paolo.
A prova no processo penal italiano.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 117. Tradução de
Alexandra Martins e Daniela Mróz.
23 COMOGLIO, Luigi Paolo.
Le prove civili.
Torino: UTET, 1999
, p. 574. Esclarece o autor que estruturalmente diverso
é o testemunho
de relato ex parte
, em que a testemunha faz referência a um conhecimento aprendido a partir de um dos