

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 90-106, Janeiro/Abril 2017
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direta ou indiretamente, através da fala, a imagem do fato a ser provado,
mas isso não significa que à sequência argumentativa aplicada às afirmações
de um declarante não se encaixe uma atividade do tipo indutivo ou abduti-
vo, destinada a alcançar conclusões cognitivas não implícitas nas premissas
externadas.
A configuração do testemunho como prova
4
pressupõe a observância
do procedimento dialético ou contraditório, segundo o marco de garantias
extraído das convenções internacionais de direitos humanos, que preveem o
direito das partes de fazer interrogar as testemunhas.
Basta que seja respeitada a referida participação na formação da pro-
va, pouco importando a maior ou menor intensidade com que o direito
interno regulamenta o respectivo procedimento. E, sob este enfoque, é irre-
levante, por exemplo, se as perguntas das partes são formuladas diretamente
à testemunha ou por intermédio do juiz.
5
Para o Direito brasileiro, a qualificação do testemunho como prova
pressupõe a intervenção do juiz na sua produção. Essa característica, aponta
a doutrina,
6
resulta da aplicação do princípio da imediação.
7
A intervenção judicial na produção da prova tem duas finalidades:
a primeira finalidade é cognitiva, no sentido de permitir uma maior inten-
sidade no contato do destinatário da prova com os dados probatórios;
8
a
4 Scarance Fernandes lembra com propriedade que são três os caracteres do testemunho: a
oralidade
, a
objetividade
e a
retrospectividade
. Em regra, a prova testemunhal é colhida por depoimento oral, art. 204 do CPP, sendo excepcionais
os casos em que se admite depoimento escrito, conforme art. 192 e parágrafo único do art. 223, ambos do CPP (SCA-
RANCE FERNANDES, Antonio.
Processo penal constitucional
. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 82).
Neste particular, anote-se que o princípio da imediação não só exige que o juiz ouça direta e pessoalmente a testemunha,
como que seja esta que fale e se expresse direta e pessoalmente ante a presença do juiz. Assim, não se considera como
verdadeira prova testemunhal a declaração prestada fora do processo e consignada em ato notarial. Contudo, e sempre
com caráter excepcional, por razões de justiça material, se não existe outro meio de provar um determinado fato, e com
todas precauções e reservas, poderia outorgar-se um certo valor probatório a uma declaração assim realizada. Neste
sentido: CLIMENT DURÁN, Carlos.
La prueba penal.
Tomo I. 2ª ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2005, pp. 117-118.
5 No entanto, sob o enfoque da imediação, a questão é de grande relevância: as
técnicas de interrogatório
apontam que o siste-
ma de perguntas diretas é mais eficiente quando se pretende observar a reação imediata da pessoa questionada. Quando as
perguntas são mediadas ou repassadas pelo juiz, a testemunha tem um tempo – ainda que ínfimo – para pensar na resposta
que deve dar. Sobre a questão da
afetação do contexto
: LANUZA TORRES, Juan José de; LILLO CAMPOS, Francisco Javier.
Interrogatorio: tecnología de la comunicación en el ámbito jurídico.
2ª ed. Madrid: Difusión Jurídica y Temas de
Actualidade, 2011, pp. 142 e ss.
6 ALVIM, Eduardo Arruda; ALVIM, Tereza Arruda.
Manual de direito processual civil.
Vol. 2. 4ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1994, p. 247.
7 Dentro de um conceito próprio, é possível definir o instituto da seguinte forma:
princípio da imediação consiste na contempo-
rânea e contínua interação comunicacional entre juiz, partes e provas (pessoais), a fim de que o julgador possa conhecer pessoal e diretamente
as alegações das partes e o acervo probatório do processo, desde sua iniciação
(ALONSO GOMES, Décio.
Prova e imediação no
processo penal.
Salvador: JusPodivm, p. 56).
8 O que pode ser atenuado no caso de
provas colhidas
a
dist
â
ncia
, quando o juiz que conduz a colheita da prova não é o juiz
que prolatará a decisão. Esta
quebra de imediação
pode ser contornada pela utilização de ferramentas comunicacionais e
tecnológicas modernas, como a videoconferência.