

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 90-106, Janeiro/Abril 2017
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as percepções sensoriais apreendidas pelo declarante quando presenciou ou
tomou conhecimento do fato histórico a que se refere e que agora tem que
ser provado, sendo indiferente a natureza da percepção (logo, o testemunho
não se limita mais à antiga fórmula do
visu vel auditu
, devendo abranger
todos os âmbitos sensórios humanos).
A prova testemunhal sofre de uma curiosa dicotomia. Em que pese
ser reconhecido que o processo penal passa por um
reinado da testemunha
,
considerada o meio de prova mais utilizado,
12
também se destaca o valor in-
trínseco dúbio e precário desse meio, diante do elevado grau de falibilidade
desta prova.
13
Neste particular, a prova testemunhal é, por suas características, uma
prova débil, possivelmente a mais débil das provas (dependendo da hipótese
de deliberada falsidade do declarante), estando sujeita a graves fatores de
distorção que podem nela influir.
14
...Efetivamente, o que o juiz e as partes percebem diretamente
é o depoimento testemunhal acerca do qual os fatos ocorreram
de uma determinada forma. E a partir deste discurso, que, ob-
viamente, deve ser interpretado e valorado criticamente – tanto
a partir de um ponto de vista da credibilidade que possa me-
recer o emissor como de qualidade informativa de seu conte-
údo – e situado no contexto dos demais elementos de juízo,
deve chegar a um certo referente fático, o que só pode fazer-se
através de um jogo de referências, fundado em máximas de
experiência, que pode ser, certamente, complexo. É pelo que
o tratamento deste meio de prova requer dois exames. Um so-
bre a credibilidade da testemunha, para saber se o declarado
é o que realmente conhece e se seu testemunho é, portanto,
12 Neste sentido: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Processo penal.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 325.
M
enna
destaca que em um sistema processual centrado no princípio do contraditório, oralidade e imediação, a prova
testemunhal ocupa posição central, uma vez que é a que melhor destaca no panorama probatório a capacidade de condi-
cionamento dialético do conhecimento no processo, e mais se inclina aos esforços de aprofundamento do juiz e das partes
(MENNA, Mariano
et al
.
Trattato di procedura penale.
Vol. II, Tomo I. Torino: UTET, 2009, p. 109).
13
A testemunha de fatos que, por suas características de excepcionalidade e dramatismo, a afetaram ética ou emocionalmente de forma in-
tensa, nunca é um observador neutro nem, portanto, bom observador, sobretudo se se trata de dados fisionômicos. Estas afirmações são ainda
mais pertinentes no caso da vítima
(ANDRÉS IBÁÑEZ, Perfecto. Sobre o valor da imediação (uma aproximação crítica),
in
:
Valoração da prova e sentença penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 28. Tradução de Lédio Rosa de Andrade).
14 Como limites fisiológicos à observação e eventuais déficts sensoriais; características individuais, expectativas e pré-
-conceitos; estado emotivo, duração e condições da observação; seletividade perceptiva, transferência inconsciente de
memória, falsas memórias; interferências de informações sucessivas; pressões sociais; atividade cognitiva-reconstrutiva;
modo de formulação das perguntas etc.