

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 72 - 89, Janeiro/Abril 2017
81
quela ocasião, a Suprema Corte, com base no voto do Min. Sepúlveda Per-
tence, assentou, a partir de interpretação do já citado art. 37, § 4ª da CR/88,
que “
a ação de improbidade administrativa é uma ação civil
”
26
, razão pela
qual não haveria que se falar em foro por prerrogativa de função.
Estabelecida a diferença quanto à natureza jurídica da ação de impro-
bidade e dos crimes de responsabilidade, desponta a conclusão no sentido
da possibilidade de convivência harmônica entre os dois regimes. É esta a
lição de Eduardo Bim, para quem, “
tendo naturezas diferenciadas, a previ-
são de uma conduta ímproba de crimes de responsabilidade não consome a
improbidade administrativa com a mesma tipificação.
”.
27
Nem se pode afirmar que, pelo princípio da especialidade, a legislação
dos crimes de responsabilidade deveria ser aplicada a determinados agentes
públicos em detrimento da LIA. Isto porque, como as naturezas jurídicas são
distintas, não há espaço para a aplicação do referido princípio.
28
Portanto, não há que se falar em
bis in idem
, sendo perfeitamente
possível a convivência da LIA com o regime dos crimes de responsabilidade,
seja por causa do amplíssimo escopo da LIA, seja por causa da diferença
quanto à natureza jurídica.
Ressalte-se, apenas, que, na linha do voto do Min. Carlos Britto na
Questão de Ordem na Petição nª 3.923-8/SP, analisado mais adiante, o único
agente público que não pode sofrer a incidência da LIA é o Presidente da
República. Isto por causa de uma opção política da Constituição de 1988,
que, no seu art. 85, V, considera como crime de responsabilidade todos os
atos do Presidente da República, e somente dele, que atentarem contra a
“
probidade na administração
”.
29
Nas próximas linhas, será analisada a evolução da matéria no âmbito
do STF, tomando-se como ponto de partida a Reclamação nª 2.138-6/DF,
para se chegar, enfim, ao entendimento de sua 1º Turma, proferido em 2016,
nos autos do Agravo Regimental na Reclamação nª 2.186/DF.
26 ADI 2797, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 15/09/2005, DJ 19/12/2006.
27 BIM, Eduardo Furtado. A possibilidade de cumulação dos crimes de responsabilidade (impeachment) e da improbida-
de administrativa dos agentes políticos por distinção de suas naturezas jurídicas.
In
:
Revista de Direito do Estado
, nº 5
(jan/marc de 2007), Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 225.
28 Neste sentido, Eduardo Bim: “
Embora se discorde dessa natureza jurídica, por esse mesmo prisma não haveria que se falar em uma
maior especialização da punição de improbidade administrativa dos agentes políticos, isentando-os do regime da LIA, porque a natureza de
ambos seria diversa: penal para os crimes de responsabilidade e qualquer outra natureza que não a penal para a improbidade administrativa
da LIA. Tendo natureza diversa, é insustentável admitir-se a aplicação do critério da especialidade, uma vez que esse critério somente pode
ser aplicado quando em face da mesma natureza jurídica.
” BIM, Eduardo Furtado. A possibilidade de cumulação dos crimes de
responsabilidade (impeachment) e da improbidade administrativa dos agentes políticos por distinção de suas naturezas
jurídicas.
Revista de Direito do Estado
, nº 5 (jan/marc de 2007), Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 212.
29 Art. 85, V da CR/88: “
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição
Federal e, especialmente, contra: V - a probidade na administração
”